Lição nº62 e 63
21-01-2010
Sumário – Inicio do módulo 3.
Continuação dos trabalhos de grupo: apresentação de relatório intermédio.
Entrega dos testes de avaliação.
Lição nº 64 e 65
22-01-2010
Sumário - Módulo 3 uma breve introdução.
Processos cognitivos, motivacionais e emocionais.
Lição nº 66 e 67
25-01-2010
Sumário – Continuação dos trabalhos de grupo.
A percepção.
Lição nº 68 e 69
28-01-2010
Sumário – Os processos perceptivos. Vários exemplos.
Lição nº 70 e 71
1-02-2010
Sumário – Apresentação dos trabalhos finais de grupo.
Lição nº 72 e 73
04-02-2010
Sumário – Processos cognitivos. Continuação.
Ficha de trabalho.
Lição nº 74 e 75
08-02-2010
Sumário – Processos cognitivos: memória e aprendizagem.
Lição nº 76 e 77
11-02-2010
Sumário – Teste de avaliação.
Lição nº 78 e 79
18-02-2010
Sumário – Entrega e correcção dos testes.
Processos cognitivos.
Lição nº 80 e 81
22-02-2010
Sumário – Preparação da visita de estudo á Infancoop.
Trabalho individual: o que significa percepcionar? (observar uma paisagem).
Lição nº 82 e 83
25-02-2010
Sumário – Visionamento do filme “Um bom rebelde”.
A questão da relação entre inteligência (aprendizagem, memória e pensamento).
Inteligência emocional.
Lições nsº 84, 85, 86 e 87
01-03-2010
Sumário – Visita de estudo á Infancoop.
Lição nº 88 e 89
04-03-2010
Sumário – Auto imagem auto estima. Inteligência emocional (conclusão do visionamento do filme “Um bom rebelde”.
Lição nº 90 e 91
08-03-2010
Sumário – Visionamento do filme “Um bom rebelde”. Conclusão.
Inicio do módulo 4.
Lição nº 92 e 93
11-03-2010
Sumário – Forrest Gump. Continuação.
Lição nº 94 e 95
15-03-2010
Sumário – Conceito de inteligência emocional e as suas implicações das relações interpessoais.
Lição nº 94 e 95
22-03-2010
Sumário - Emoção e motivação.
Estratégias para a gestão de crenças e atitudes inadequadas.
Lição nº 98 e 99
25-03-2010
Sumário – Habilidades de inter-relacionamento pessoal .
sábado, 24 de abril de 2010
...Perguntas sobre o filme “Forrest Gump”
1) Será Forrest inteligente?
• Certo, Forrest é inteligente na parte motora, nenhum corre como ele, e nenhum joga pingue-pongue como ele. Mas não é um sujeito culto, por vezes não tem consciência das coisas que faz.
2) Porque é que Forrest é muitas vezes considerado estúpido?
• Forrest por vezes é apreciado com estúpido devido as posturas em que se apresenta, desamparado por a sua preferida em muitas ocasiões deste a sua infância, mas mesmo assim sempre aguardou por ela e nunca se aborreceu pelas maneiras tomadas pela parte dela.
3) Que influência teve a mãe na sua vida?
• Para Forrest a sua mãe era tudo para ele, tinha muita importância na sua vida mesmo depois de ter falecido tinha a mãe sempre presente era uma pessoa muito importante para o mesmo.
4) De que forma a vivência da Guerra o marcou como pessoa?
• Forrest na guerra possuiu uma atitude de risco. Arriscou a sua vida para salvar os seus amigos e não deixou ninguém para traz, apesar de seu amigo Boba ter falecido ele realizou o sonho de barco.
5) Perante problemas muito diversos que tipo de atitude Forrest costuma ter?
• Forrest tentava sempre resolver seus problemas, de cabeça levantada e não invertia para traz, sempre para afrente para seguir o seu caminho. Uma pessoa que quando garantia algum acontecimento tinha que a seguir em frente se não ficava mal consigo próprio.
• Certo, Forrest é inteligente na parte motora, nenhum corre como ele, e nenhum joga pingue-pongue como ele. Mas não é um sujeito culto, por vezes não tem consciência das coisas que faz.
2) Porque é que Forrest é muitas vezes considerado estúpido?
• Forrest por vezes é apreciado com estúpido devido as posturas em que se apresenta, desamparado por a sua preferida em muitas ocasiões deste a sua infância, mas mesmo assim sempre aguardou por ela e nunca se aborreceu pelas maneiras tomadas pela parte dela.
3) Que influência teve a mãe na sua vida?
• Para Forrest a sua mãe era tudo para ele, tinha muita importância na sua vida mesmo depois de ter falecido tinha a mãe sempre presente era uma pessoa muito importante para o mesmo.
4) De que forma a vivência da Guerra o marcou como pessoa?
• Forrest na guerra possuiu uma atitude de risco. Arriscou a sua vida para salvar os seus amigos e não deixou ninguém para traz, apesar de seu amigo Boba ter falecido ele realizou o sonho de barco.
5) Perante problemas muito diversos que tipo de atitude Forrest costuma ter?
• Forrest tentava sempre resolver seus problemas, de cabeça levantada e não invertia para traz, sempre para afrente para seguir o seu caminho. Uma pessoa que quando garantia algum acontecimento tinha que a seguir em frente se não ficava mal consigo próprio.
...Como se constroi um percepsão de nos mesmos? e dos outros?
Como se constrói a percepção de nos mesmos e dos outros?
Eu sou uma pessoa que gosta de ajudar os outros, mas também gosto de ser ajudada. Sou muito racista, talvez porque sempre ouvi o meu pai a “falar mal” de pessoas de outras raças.
Gosto muito de sair com os meus colegas para me divertir um pouco, mas por vezes prefiro estar sozinha.
Não tiro decisões precipitadas das pessoas, mas quando me fazem algo que eu não goste sou capaz de deixar de falar a essa pessoa, é raro dar uma segunda oportunidade, porque sou muito orgulhosa.
Sou uma pessoa que expludo com muita facilidade, e ai digo o que quero e também o que não quero por vezes magoou-o os sentimentos das outras pessoas. Quando as coisas não estão bem com uma certa pessoa não vou fingir que está tudo bem, dirijo-me à própria pessoa e falo com ela.
Acho que as pessoas podem contar comigo para o que quiserem, porque apesar dos meus defeitos todos sou uma boa colega.
Como é que os outros constroem uma imagem sobre
Nós?
Eu penso que a Ana é uma pessoa com uma personalidade muito forte, é amiga do seu amigo, quando é acordada fica muito rabugenta.
A Ana tem um feitio muito especial, é igual ao pai, gosta muito da família e adora estar a brincar com a mãe.
Quando ela tem alguma coisa a disser ela não esconde e diz seja a quem for, é uma pessoa que quando não gosta de alguma coisa é a primeira a falar seja para bem ou para o mal.
Por vezes não mede bem aquilo que diz e acaba por ser injusta, como ela costuma disser “a ultima tem de ser minha”
Gosta de sair com os amigos mas também gosta do seu cantinho.
Não gosta de ser repreendida, porque quando o fazem ela faz pior, mas por outro lado também é uma pessoa muito doce e eu como irmã sei que posso contar sempre com ela.
Catia Rijo
Eu sou uma pessoa que gosta de ajudar os outros, mas também gosto de ser ajudada. Sou muito racista, talvez porque sempre ouvi o meu pai a “falar mal” de pessoas de outras raças.
Gosto muito de sair com os meus colegas para me divertir um pouco, mas por vezes prefiro estar sozinha.
Não tiro decisões precipitadas das pessoas, mas quando me fazem algo que eu não goste sou capaz de deixar de falar a essa pessoa, é raro dar uma segunda oportunidade, porque sou muito orgulhosa.
Sou uma pessoa que expludo com muita facilidade, e ai digo o que quero e também o que não quero por vezes magoou-o os sentimentos das outras pessoas. Quando as coisas não estão bem com uma certa pessoa não vou fingir que está tudo bem, dirijo-me à própria pessoa e falo com ela.
Acho que as pessoas podem contar comigo para o que quiserem, porque apesar dos meus defeitos todos sou uma boa colega.
Como é que os outros constroem uma imagem sobre
Nós?
Eu penso que a Ana é uma pessoa com uma personalidade muito forte, é amiga do seu amigo, quando é acordada fica muito rabugenta.
A Ana tem um feitio muito especial, é igual ao pai, gosta muito da família e adora estar a brincar com a mãe.
Quando ela tem alguma coisa a disser ela não esconde e diz seja a quem for, é uma pessoa que quando não gosta de alguma coisa é a primeira a falar seja para bem ou para o mal.
Por vezes não mede bem aquilo que diz e acaba por ser injusta, como ela costuma disser “a ultima tem de ser minha”
Gosta de sair com os amigos mas também gosta do seu cantinho.
Não gosta de ser repreendida, porque quando o fazem ela faz pior, mas por outro lado também é uma pessoa muito doce e eu como irmã sei que posso contar sempre com ela.
Catia Rijo
...Relatório da visita de estudo a infancoop
Data da visita – 1/03/2010
Actividade – Visita de estudo à Infancoop
Partida – 09.00 horas
Chegada – 17.00 horas
Sala das estrelícias – é um jardim-de-infância com mais ou menos 16 crianças com idades os três aos seis anos de idade, sala heterogenia.
A actividade foi promovida para observarmos o dia-a-dia das crianças e o seu desenvolvimento cognitivo e psicossocial.
Na sala onde tive havia crianças de várias idades, as crianças de três anos umas ainda faziam as necessidades na cama, outras já tinham autonomia para pedir para ir a casa de banho. Umas crianças gostaram da nossa visita e só queriam brincar, outras a nossa visita foi indiferente preferiram brincar sozinhos. Havia crianças que já conseguiam comer sozinhas, outras ainda precisavam de ajuda.
A sala onde fiquei estava bem estruturada, havia cantinhos para tudo como por exemplo a casinha das bonecas e o momento para a pintura. Mas acho que era um pouco pequena.
A educadora e a auxiliar técnica têm as duas, um papel muito importante, e gostei muito da forma que elas trabalhavam uma com a outra, que nem cheguei a perceber quem era a verdadeira educadora. Foram amáveis para as crianças, e falavam de uma voz calma. Foram super profissionais.
Gostei muito deste dia, foi uma experiencia muito boa. Pensava que ia ser pior e que as crianças não nos fossem aceitar tão bem. Uma das crianças fez anos levou um bolo para cantar-mos os parabéns, então guardaram um pedaço de bolo para análise caso acontecesse alguma coisa, achei muito interessante. Foi um dia espectacular.
Actividade – Visita de estudo à Infancoop
Partida – 09.00 horas
Chegada – 17.00 horas
Sala das estrelícias – é um jardim-de-infância com mais ou menos 16 crianças com idades os três aos seis anos de idade, sala heterogenia.
A actividade foi promovida para observarmos o dia-a-dia das crianças e o seu desenvolvimento cognitivo e psicossocial.
Na sala onde tive havia crianças de várias idades, as crianças de três anos umas ainda faziam as necessidades na cama, outras já tinham autonomia para pedir para ir a casa de banho. Umas crianças gostaram da nossa visita e só queriam brincar, outras a nossa visita foi indiferente preferiram brincar sozinhos. Havia crianças que já conseguiam comer sozinhas, outras ainda precisavam de ajuda.
A sala onde fiquei estava bem estruturada, havia cantinhos para tudo como por exemplo a casinha das bonecas e o momento para a pintura. Mas acho que era um pouco pequena.
A educadora e a auxiliar técnica têm as duas, um papel muito importante, e gostei muito da forma que elas trabalhavam uma com a outra, que nem cheguei a perceber quem era a verdadeira educadora. Foram amáveis para as crianças, e falavam de uma voz calma. Foram super profissionais.
Gostei muito deste dia, foi uma experiencia muito boa. Pensava que ia ser pior e que as crianças não nos fossem aceitar tão bem. Uma das crianças fez anos levou um bolo para cantar-mos os parabéns, então guardaram um pedaço de bolo para análise caso acontecesse alguma coisa, achei muito interessante. Foi um dia espectacular.
sábado, 10 de abril de 2010
-Teorias da motivação
Maslow e a hierarquia das motivações
Abraham Maslow defendeu uma teoria cujo princípio é o de que o nosso comportamento é comandado por necessidades que se organizam segundo uma hierarquia.
O seu modelo explicativo das motivações assenta nos seguintes fundamentos ou pressupostos:
1 As pessoas só atingem um nível superior de motivação se as necessidades do nível anterior estiverem satisfeitas. Isto significa que a satisfação das necessidades superiores depende da satisfação das necessidades básicas.
2 À medida que se sobe a escala hierárquica das motivações, vai crescendo a diferença entre o que é comum aos homens e aos outros animais e aquilo que é específico dos seres humanos.
3 As necessidades dos níveis inferiores são sentidas pela totalidade dos seres humanos, enquanto as necessidades dos níveis superiores surgem apenas num número cada vez mais reduzido de pessoas.
Esta é a razão por que Maslow representa a hierarquia sob a forma de pirâmide e não de um cilindro ou paralelepípedo.
• Na base da hierarquia situam-se as necessidades orgânicas de alimentação, água, oxigénio, sono, actividade e satisfação sensorial. Estas necessidades são relativamente satisfeitas em grande parte dos países ocidentais. Porém, há no mundo um largo estrato populacional em que estas carências motivacionais básicas não se encontram eliminadas, pelo que não se manifestam motivações de nível superior. É que as necessidades de um nível têm de ser satisfeitas para que as necessidades do nível seguinte se manifestem como determinantes da acção.
• Uma vez assegurado o bem-estar fisiológico do indivíduo, este experimenta vários graus de ansiedade respeitantes a ameaças corporais e a sensações de segurança. As necessidades relativas à segurança individual manifestam-se muito cedo. Com efeito, sabemos bem como as crianças correm a acolher-se junto da mãe, assim que pressentem o menor sintoma de perigo.
• As necessidades de amor e de pertença, cuja satisfação é conseguida quando a pessoa sente que é desejada, que pertence a alguém e a algum lugar e que faz parte de grupos em que é aceite e amada, reporta-nos também para a importância das relações mãe-filho estabelecidas durante a infância. Esta relacionação mãe-filho funciona como um paradigma da possível convivência futura com os outros.
• Se no nível de necessidades que acabámos de referir, o indivíduo se contenta em ser amado tal como é, se deseja o amor dos outros só porque existe, a este nível da escala de Maslow, o indivíduo procura merecer a aceitação e o respeito através da sua actuação. Para que a necessidade de estima seja satisfeita procura, pois, assumir o seu estatuto de modo a granjear a aprovação por parte dos outros. Quando o homem consegue que a sua actuação seja apreciada e o tomem por um indivíduo competente, torna-se auto-confiante e capaz de ascender ao nível mais elevado de aspirações e que consiste na sua auto-realização.
• A necessidade de o indivíduo realizar as suas potencialidades, qualquer que seja o campo em que se situem, coloca-se no topo da hierarquia. Uma das condições para que seja possível actualizar tudo o que está latente no homem é aquilo a que Carl Rogers chama a liberdade psicológica.
Assim, as metas da natureza mais elevada exigem do homem grande poder de iniciativa, enorme capacidade criativa, premente desejo de enfrentar situações problemáticas, suficientes aptidões para as resolver, e ainda força de vontade para realizar escolhas. Quando estas capacidades despontam e se explicitam no desempenho cabal das tarefas, o homem atinge elevado grau de êxito e de realização pessoal.
A pirâmide de Maslow tem sido amplamente aceite pelo facto de permitir uma visão suficientemente ampla das motivações humanas, desde a satisfação das necessidades biológicas até à experiência gratificante do sucesso.
Freud e a motivação como energia
A teoria da personalidade de Freud é também uma teoria da motivação. No centro, situam-se os conceitos-chave de pulsão e de conflito.
Freud e as motivações inconscientes.
Pulsão
A pulsão é, no entender de Freud, uma força ou energia que tem como fonte determinada condição orgânica e como objectivo a satisfação da necessidade. Tal satisfação obtém-se pela descarga do excesso de tensão acumulada, o que é conseguido pela utilização dos meios mais diversificados em função das culturas, das idades e das aprendizagens.
O organismo humano é, segundo este psicanalista, uma espécie de reservatório desta energia ou força pulsional. Entre as pulsões aí existentes, Freud destaca a energia sexual, designada também pela palavra latina libido, que significa desejo, cujo papel é basilar na determinação do comportamento humano.
Tal como acontece com um balão demasiado cheio ou com a água quente acumulada sob um “geyser”, a libido acumulada, à medida que atinge determinado nível crítico, tem que encontrar uma saída para descarga. Dá-se então a libertação, restabelecendo-se o equilíbrio do indivíduo.
Se a saída normal estiver bloqueada, a libertação tenderá a efectuar-se por outras vias. Isto explica que muitas pessoas, que não conseguem descarregar livremente a sua libido, acabem por se envolver, mais tarde ou mais cedo, aparentemente em comportamentos fora do normal.
Conflito intra psíquico
Frustrações e conflitos ocorrem quando obstáculos se opõem à realização dos desejos individuais. Inicialmente, o obstáculo é, como sabemos, exterior ao indivíduo. Porém, a partir do momento em que o superego se constitui pela interiorização das regras e interdições sociais, o obstáculo toma-se também interno.
Assim, o indivíduo passa a viver situações conflituosas, a que Freud deu o nome de conflitos intrapsíquicos, e em que se opõem energias ligadas ao instinto de vida – eros – e ao instinto de morte – thanatos- , energias ligadas ao amor e ao ódio, à criatividade e à destruição.
Tais situações conflituosas constituem como que um desafio aos indivíduos no sentido de encontrarem estratégias adequadas para a sua resolução. Algumas estratégias são devidas à intervenção da vontade que, conscientemente, resolvem a situação problemática base. Porém, muitas outras estratégias ligam-se a mecanismos inconscientes que constituem aquilo que, em psicanálise, se designa por mecanismos de defesa do eu.
Mecanismos de defesa do eu
Todos os mecanismos com que o ego se autoprotege apresentam em comum três características:
• Negam, falsificam ou distorcem a realidade.
• Operam inconscientemente, pelo que a pessoa não se apercebe do que está a acontecer.
• Visam reduzir a tensão interior do indivíduo, ou seja, diminuir-lhe a ansiedade.
MECANISMOS DE DEFESA DO EGO
Estratégias inconscientes de resolução dos conflitos internos e consequente redução das forças pulsionais que se lhe situam na origem.
Entre os mecanismos de defesa situam-se o recalcamento, a racionalização, a projecção, o deslocamento, a regressão, a compensação e a sublimação.
1. Recalcamento
Segundo alguns psicólogos, o conceito de recalcamento foi uma das primeiras e mais importantes descobertas de Freud. A sua descoberta ocorreu ao observar que os seus pacientes tinham dificuldade em recordar acontecimentos traumáticos e que, quando o conseguiam, não o faziam sem dor. Conclui, então, que tais acontecimentos tinham sido excluídos da consciência e estavam aprisionados no inconsciente.
O recalcamento apresenta-se como um mecanismo de repressão de pensamentos, recordações, sentimentos, pulsões e desejos que, por provocarem ansiedade, são excluídos da consciência.
Assim, o soldado que assistiu à morte de um amigo, ferido em campo de batalha, pode, ao regressar da guerra, não ter qualquer recordação deste incidente dramático.
No entanto, este acontecimento, banido da consciência pelo processo de reca1camento, continua activo no inconsciente e a influenciar o comportamento do sujeito, podendo, mesmo, provocar-lhe perturbações psíquicas.
Exemplos
Jogos
Ciberterapia trata traumas de guerra
Um grupo de cientistas inspirou-se no videojogo 'Full Spectrum Warrior' para criar um mundo virtual que ajuda militares a ultrapassarem traumas causados pela guerra.
Um cenário virtual cria um ambiente realista onde se recriam situações da guerra no Iraque. O objectivo desta ciberterapia, desenvolvida por investigadores e psicólogos da Universidade da Califórnia do Sul, nos EUA, é ajudar a tratar os traumas causados pela guerra.
A inspiração para este tratamento veio de um videojogo, o 'Full Spectrum Warrior' e Skip Rizzo, psicólogo que com outros investigadores desenvolveu esta inovadora abordagem terapêutica de ciberpsicologia, defende que “há um grande potencial de tratamento clínico escondido nestes cenários virtuais”.
Instalados numa cabine, com óculos especiais e auscultadores, os soldados que combateram no Iraque voltam virtualmente ao cenário de guerra.
Assim, através da realidade virtual, os cientistas levam o sujeito a reviver o momento de origem do trauma e a revelar os problemas psicológicos que estão guardados no fundo da sua memória, esclareceram os investigadores que apresentaram os resultados deste trabalho na reunião anual da Associação Americana para o Avanço da Ciência.
Está provado que a melhor forma de ultrapassar um trauma é regressar à realidade, embora neste caso de forma virtual.
Traumas de guerra justificam crime
2006/04/28
Assassino de violinista de Estarreja alega também os «valores dos comandos»
A defesa de Álvaro Ferreira, que está a ser julgado em Estarreja pelo homicídio do violinista António Oliveira e Silva, procurou hoje explicar o crime com os «valores» dos comandos e os «traumas» de guerra.
A 14 de Janeiro de 2005, Álvaro Ferreira - que integrou os Comandos e as forças especiais - entrou com uma caçadeira num restaurante na Torreira, que estava cheio de clientes, e disparou à queima-roupa sobre o violinista.
O arguido terá agido motivado por ciúmes, dado que a vítima manteria um caso com a companheira do agressor, com quem jantava.
No Tribunal de Estarreja desfilaram hoje vários ex-camaradas de armas do arguido na guerra colonial, depondo em seu favor.
Um dos depoimentos mais relevantes foi o do seu antigo comandante de unidade, coronel Matos Gomes, o qual explicou que a formação dada aos Comandos valorizava o valor da lealdade e repudiava a traição, procurando incutir nos jovens a virilidade.
«Eram valores que se exaltavam nos anos 70, hoje politicamente incorrectos», disse em tribunal aquele coronel na reserva.
Matos Gomes reconheceu que os seus homens estiveram a combater «nas zonas operacionais mais complicadas», o que terá deixado sequelas em alguns deles, e afirmou conhecer pelo menos mais dois casos de envolvimento em homicídios depois da desmobilização e alguns de suicídios, mas salientou que «não é o comportamento maioritário».
Racionalização
Contam que certa raposa
Andando muito esfaimada
Viu roxos, maduros cachos
Pendentes de alta latada.
De bom grado os trincaria
Mas sem lhes poder chegar
Disse: "Estão verdes, não prestam,
Só os cães os podem tragar!"
Eis que cai uma parra, quando
Prosseguia o seu caminho,
E, crendo que era algum bago,
Volta depressa o focinho
Bocage
A fábula da raposa e das uvas, de Esopo, descrita poeticamente por Bocage, constitui exemplo da racionalização. A raposa simboliza os indivíduos que, incapazes de superar o obstáculo, e não querendo aceitar o fracasso, tentam autooconvencer-se da não existência deste.
Procuram estratégias de justificação, lógicas e a posteriori, com o fim de evitar sentimentos de inferioridade que ponham em risco a auto-estima.
A racionalização inscreve-se numa forma de justificação a posteriori, com o fim de evitar sentimentos de inferioridade que ponham em risco a auto-estima. Racionalizando, apresentam-se argumentos justificativos de uma conclusão que, à partida, era tida como verdadeira.
É o que se passa quando os elementos de uma equipa desportiva perdem um desafio por manifesta incapacidade técnica e justificam o resultado apelando para factores como: mau tempo, parcialidade do árbitro em "casa" do adversário e outros. Também um aluno que presta uma má prova por deficiente preparação pode reagir à frustração apontando como motivos do insucesso uma má disposição ou uma elaboração incorrecta do enunciado do exercício.
Projecção
Um aluno que não gosta de um professor dirá que esse professor o detesta. Pais ambiciosos em relação aos filhos projectam neles o seu desejo de sucesso nunca alcançado. Ódios raciais podem ser projecções mútuas das próprias características negativas. Uma pessoa má e agressiva tende a ver os outros como maus e agressivos.
Estes comportamentos são exemplos típicos de reacções de projecção.
A Projecção apresenta-se como uma tendência que os seres humanos têm de atribuir aos outros comportamentos, sentimentos e desejos que, sendo deles próprios, são muitas vezes tidos como inaceitáveis.
O mecanismo de projecção observa-se em situações da vida corrente, acerca das quais se diz, em linguagem proverbial: "Não julgues os outros por ti". É um comportamento típico na sociedade e a sua ocorrência tem por objectivos desviar o eu de uma realidade que pensa ser desagradável, enviando para os outros os processos que diminuem ou provocam insatisfação.
Deslocamento
Uma criança, impedida pela mãe de brincar com os seus companheiros, reage, muitas vezes, destruindo os seus brinquedos ou outros objectos. O empregado que se incompatibiliza com o patrão, não podendo manifestar reacção aberta contra este, receando ser despedido, desloca a agressão para os seus familiares, companheiros de quarto, ou até para os seus subordinados.
Estes exemplos mostram que a agressão nem sempre é dirigida contra o objecto original da questão, ou seja, contra aquilo que causou a frustração, podendo ser deslocada para alvos substitutos. Trata-se, nestes casos, de um mecanismo de defesa do ego designado por deslocamento.
O deslocamento é pois um mecanismo libertador que ocorre quando um sujeito, não podendo atingir determinado objecto, o substitui por outro, sobre o qual descarrega as suas tensões acumuladas.
Há muitas circunstâncias em que o indivíduo substitui as manifestações abertas de agressão por formas mais subtis e dissimuladas.
Um caso extremo de deslocamento consiste na auto-agressão, caracterizada pelo facto de o indivíduo ser ao mesmo tempo agressor e agredido.
A agressão auto dirigida manifesta-se por comportamentos variados, desde sentimentos de culpa e remorsos, até à auto mutilação e suicídio.
Se frequentemente encontramos pessoas que se censuram a si mesmas por sofrerem frustrações, comportamentos como os segundos são mais raros e, quando surgem, inscrevem-se em condutas neuróticas do foro patológico.
Regressão
A criança frustrada pela diminuição de afecto provocada pelo nascimento de um irmão pode reagir através de condutas que vão do choramingar, chupar no dedo e enurese até recusar-se a comer e a andar sozinha. Tais comportamentos, impróprios para a idade da criança, designam-se por condutas regressivas.
A regressão é um mecanismo segundo o qual o indivíduo adopta formas de conduta próprias de estádios anteriores de desenvolvimento.
A psicanálise oferece-nos exemplos de adultos cujas condutas foram regredindo, chegando à incapacidade de realização das funções vitais. Para além de casos extremos, há pessoas que tentam fugir a responsabilidades, refugiando-se na passividade de comportamentos regressivos.
A doença torna-se um meio de atrair sobre si a atenção dos outros e ver-se cercado de cuidados e de consideração e de fazer reviver, assim, por meio de um substituto dos pais (médico, pessoal do hospital, pessoas à cabeceira), as relações infantis anteriores na família. Aliás a maior parte dessas doenças são imaginárias! http://www.psiquiatriageral.com.br/tema/paranoia.htm
Albert Collette, Introduction à la psychologie dynamique
As formas de comportamento regressivo surgem, segundo a perspectiva psicanalítica, ligadas a frustrações e conflitos infantis não resolvidos ou mal ultrapassados.
Compensação
Adler, discípulo de Freud, apresenta a compensação como meio de superar situações de inferioridade.
Efectivamente, um indivíduo com locomoção deficiente pode superar as suas limitações dedicando-se à investigação científica, à actividade literária, à pintura ou escultura, conseguindo, assim, auto-afirmar-se.
Inferioridades resultantes de uma deficiente integração social podem, em muitos indivíduos, ser compensadas por uma forma exibicionista de vestuário, de atitudes e comportamentos destinados a atrair a atenção sobre si.
A compensação é assim um mecanismo de defesa contra qualquer inferioridade fisiológica ou psicológica, seja ela real ou apenas sentida, que consiste na realização de outras actividades que permitem ao indivíduo sentir-se realizado.
Sublimação
A criança encontra no jogo um meio de se tomar "capitão de navio", "explorador", "chefe de equipa", reagindo, deste modo, a frustrações sofridas no grupo familiar ou escolar.
As aventuras fantásticas, vividas no jogo, compensam a adversidade e, por vezes, a hostilidade do meio social.
Vemos, portanto, que a compensação se pode ligar, nalguns casos, à fantasia.
Esta caracteriza-se por uma fuga à realidade e verifica-se sempre que o indivíduo recorre à ficção para suprir a vivência pouco gratificante de situações reais.
Esta forma de reacção consiste essencialmente na substituição do objecto-meta da pulsão por outro socialmente aceite.
Assim, a pulsão agressiva pode ser canalizada para o exercício de actividades desportivas que impliquem força, actividade intensa e consequente dispêndio de energias, como, por exemplo, o judo.
A sublimação apresenta-se como um mecanismo que consiste em substituir uma actividade socialmente inaceitável na comunidade por outra que é moralmente aceite e socialmente valorizada.
Freud considera que a sublimação é um mecanismo de defesa contra os impulsos sexuais e agressivos. Estes impulsos, deparando com a barreira estabelecida pelos códigos sociais e morais interiorizados pelo indivíduo, não podem concretizar-se livremente e, como tal, encaminham-se para actividades artísticas, culturais e outras, permitindo ao indivíduo desfazer tensões interiores, sem correr o risco de entrar em choque com os padrões habituais.
Abraham Maslow defendeu uma teoria cujo princípio é o de que o nosso comportamento é comandado por necessidades que se organizam segundo uma hierarquia.
O seu modelo explicativo das motivações assenta nos seguintes fundamentos ou pressupostos:
1 As pessoas só atingem um nível superior de motivação se as necessidades do nível anterior estiverem satisfeitas. Isto significa que a satisfação das necessidades superiores depende da satisfação das necessidades básicas.
2 À medida que se sobe a escala hierárquica das motivações, vai crescendo a diferença entre o que é comum aos homens e aos outros animais e aquilo que é específico dos seres humanos.
3 As necessidades dos níveis inferiores são sentidas pela totalidade dos seres humanos, enquanto as necessidades dos níveis superiores surgem apenas num número cada vez mais reduzido de pessoas.
Esta é a razão por que Maslow representa a hierarquia sob a forma de pirâmide e não de um cilindro ou paralelepípedo.
• Na base da hierarquia situam-se as necessidades orgânicas de alimentação, água, oxigénio, sono, actividade e satisfação sensorial. Estas necessidades são relativamente satisfeitas em grande parte dos países ocidentais. Porém, há no mundo um largo estrato populacional em que estas carências motivacionais básicas não se encontram eliminadas, pelo que não se manifestam motivações de nível superior. É que as necessidades de um nível têm de ser satisfeitas para que as necessidades do nível seguinte se manifestem como determinantes da acção.
• Uma vez assegurado o bem-estar fisiológico do indivíduo, este experimenta vários graus de ansiedade respeitantes a ameaças corporais e a sensações de segurança. As necessidades relativas à segurança individual manifestam-se muito cedo. Com efeito, sabemos bem como as crianças correm a acolher-se junto da mãe, assim que pressentem o menor sintoma de perigo.
• As necessidades de amor e de pertença, cuja satisfação é conseguida quando a pessoa sente que é desejada, que pertence a alguém e a algum lugar e que faz parte de grupos em que é aceite e amada, reporta-nos também para a importância das relações mãe-filho estabelecidas durante a infância. Esta relacionação mãe-filho funciona como um paradigma da possível convivência futura com os outros.
• Se no nível de necessidades que acabámos de referir, o indivíduo se contenta em ser amado tal como é, se deseja o amor dos outros só porque existe, a este nível da escala de Maslow, o indivíduo procura merecer a aceitação e o respeito através da sua actuação. Para que a necessidade de estima seja satisfeita procura, pois, assumir o seu estatuto de modo a granjear a aprovação por parte dos outros. Quando o homem consegue que a sua actuação seja apreciada e o tomem por um indivíduo competente, torna-se auto-confiante e capaz de ascender ao nível mais elevado de aspirações e que consiste na sua auto-realização.
• A necessidade de o indivíduo realizar as suas potencialidades, qualquer que seja o campo em que se situem, coloca-se no topo da hierarquia. Uma das condições para que seja possível actualizar tudo o que está latente no homem é aquilo a que Carl Rogers chama a liberdade psicológica.
Assim, as metas da natureza mais elevada exigem do homem grande poder de iniciativa, enorme capacidade criativa, premente desejo de enfrentar situações problemáticas, suficientes aptidões para as resolver, e ainda força de vontade para realizar escolhas. Quando estas capacidades despontam e se explicitam no desempenho cabal das tarefas, o homem atinge elevado grau de êxito e de realização pessoal.
A pirâmide de Maslow tem sido amplamente aceite pelo facto de permitir uma visão suficientemente ampla das motivações humanas, desde a satisfação das necessidades biológicas até à experiência gratificante do sucesso.
Freud e a motivação como energia
A teoria da personalidade de Freud é também uma teoria da motivação. No centro, situam-se os conceitos-chave de pulsão e de conflito.
Freud e as motivações inconscientes.
Pulsão
A pulsão é, no entender de Freud, uma força ou energia que tem como fonte determinada condição orgânica e como objectivo a satisfação da necessidade. Tal satisfação obtém-se pela descarga do excesso de tensão acumulada, o que é conseguido pela utilização dos meios mais diversificados em função das culturas, das idades e das aprendizagens.
O organismo humano é, segundo este psicanalista, uma espécie de reservatório desta energia ou força pulsional. Entre as pulsões aí existentes, Freud destaca a energia sexual, designada também pela palavra latina libido, que significa desejo, cujo papel é basilar na determinação do comportamento humano.
Tal como acontece com um balão demasiado cheio ou com a água quente acumulada sob um “geyser”, a libido acumulada, à medida que atinge determinado nível crítico, tem que encontrar uma saída para descarga. Dá-se então a libertação, restabelecendo-se o equilíbrio do indivíduo.
Se a saída normal estiver bloqueada, a libertação tenderá a efectuar-se por outras vias. Isto explica que muitas pessoas, que não conseguem descarregar livremente a sua libido, acabem por se envolver, mais tarde ou mais cedo, aparentemente em comportamentos fora do normal.
Conflito intra psíquico
Frustrações e conflitos ocorrem quando obstáculos se opõem à realização dos desejos individuais. Inicialmente, o obstáculo é, como sabemos, exterior ao indivíduo. Porém, a partir do momento em que o superego se constitui pela interiorização das regras e interdições sociais, o obstáculo toma-se também interno.
Assim, o indivíduo passa a viver situações conflituosas, a que Freud deu o nome de conflitos intrapsíquicos, e em que se opõem energias ligadas ao instinto de vida – eros – e ao instinto de morte – thanatos- , energias ligadas ao amor e ao ódio, à criatividade e à destruição.
Tais situações conflituosas constituem como que um desafio aos indivíduos no sentido de encontrarem estratégias adequadas para a sua resolução. Algumas estratégias são devidas à intervenção da vontade que, conscientemente, resolvem a situação problemática base. Porém, muitas outras estratégias ligam-se a mecanismos inconscientes que constituem aquilo que, em psicanálise, se designa por mecanismos de defesa do eu.
Mecanismos de defesa do eu
Todos os mecanismos com que o ego se autoprotege apresentam em comum três características:
• Negam, falsificam ou distorcem a realidade.
• Operam inconscientemente, pelo que a pessoa não se apercebe do que está a acontecer.
• Visam reduzir a tensão interior do indivíduo, ou seja, diminuir-lhe a ansiedade.
MECANISMOS DE DEFESA DO EGO
Estratégias inconscientes de resolução dos conflitos internos e consequente redução das forças pulsionais que se lhe situam na origem.
Entre os mecanismos de defesa situam-se o recalcamento, a racionalização, a projecção, o deslocamento, a regressão, a compensação e a sublimação.
1. Recalcamento
Segundo alguns psicólogos, o conceito de recalcamento foi uma das primeiras e mais importantes descobertas de Freud. A sua descoberta ocorreu ao observar que os seus pacientes tinham dificuldade em recordar acontecimentos traumáticos e que, quando o conseguiam, não o faziam sem dor. Conclui, então, que tais acontecimentos tinham sido excluídos da consciência e estavam aprisionados no inconsciente.
O recalcamento apresenta-se como um mecanismo de repressão de pensamentos, recordações, sentimentos, pulsões e desejos que, por provocarem ansiedade, são excluídos da consciência.
Assim, o soldado que assistiu à morte de um amigo, ferido em campo de batalha, pode, ao regressar da guerra, não ter qualquer recordação deste incidente dramático.
No entanto, este acontecimento, banido da consciência pelo processo de reca1camento, continua activo no inconsciente e a influenciar o comportamento do sujeito, podendo, mesmo, provocar-lhe perturbações psíquicas.
Exemplos
Jogos
Ciberterapia trata traumas de guerra
Um grupo de cientistas inspirou-se no videojogo 'Full Spectrum Warrior' para criar um mundo virtual que ajuda militares a ultrapassarem traumas causados pela guerra.
Um cenário virtual cria um ambiente realista onde se recriam situações da guerra no Iraque. O objectivo desta ciberterapia, desenvolvida por investigadores e psicólogos da Universidade da Califórnia do Sul, nos EUA, é ajudar a tratar os traumas causados pela guerra.
A inspiração para este tratamento veio de um videojogo, o 'Full Spectrum Warrior' e Skip Rizzo, psicólogo que com outros investigadores desenvolveu esta inovadora abordagem terapêutica de ciberpsicologia, defende que “há um grande potencial de tratamento clínico escondido nestes cenários virtuais”.
Instalados numa cabine, com óculos especiais e auscultadores, os soldados que combateram no Iraque voltam virtualmente ao cenário de guerra.
Assim, através da realidade virtual, os cientistas levam o sujeito a reviver o momento de origem do trauma e a revelar os problemas psicológicos que estão guardados no fundo da sua memória, esclareceram os investigadores que apresentaram os resultados deste trabalho na reunião anual da Associação Americana para o Avanço da Ciência.
Está provado que a melhor forma de ultrapassar um trauma é regressar à realidade, embora neste caso de forma virtual.
Traumas de guerra justificam crime
2006/04/28
Assassino de violinista de Estarreja alega também os «valores dos comandos»
A defesa de Álvaro Ferreira, que está a ser julgado em Estarreja pelo homicídio do violinista António Oliveira e Silva, procurou hoje explicar o crime com os «valores» dos comandos e os «traumas» de guerra.
A 14 de Janeiro de 2005, Álvaro Ferreira - que integrou os Comandos e as forças especiais - entrou com uma caçadeira num restaurante na Torreira, que estava cheio de clientes, e disparou à queima-roupa sobre o violinista.
O arguido terá agido motivado por ciúmes, dado que a vítima manteria um caso com a companheira do agressor, com quem jantava.
No Tribunal de Estarreja desfilaram hoje vários ex-camaradas de armas do arguido na guerra colonial, depondo em seu favor.
Um dos depoimentos mais relevantes foi o do seu antigo comandante de unidade, coronel Matos Gomes, o qual explicou que a formação dada aos Comandos valorizava o valor da lealdade e repudiava a traição, procurando incutir nos jovens a virilidade.
«Eram valores que se exaltavam nos anos 70, hoje politicamente incorrectos», disse em tribunal aquele coronel na reserva.
Matos Gomes reconheceu que os seus homens estiveram a combater «nas zonas operacionais mais complicadas», o que terá deixado sequelas em alguns deles, e afirmou conhecer pelo menos mais dois casos de envolvimento em homicídios depois da desmobilização e alguns de suicídios, mas salientou que «não é o comportamento maioritário».
Racionalização
Contam que certa raposa
Andando muito esfaimada
Viu roxos, maduros cachos
Pendentes de alta latada.
De bom grado os trincaria
Mas sem lhes poder chegar
Disse: "Estão verdes, não prestam,
Só os cães os podem tragar!"
Eis que cai uma parra, quando
Prosseguia o seu caminho,
E, crendo que era algum bago,
Volta depressa o focinho
Bocage
A fábula da raposa e das uvas, de Esopo, descrita poeticamente por Bocage, constitui exemplo da racionalização. A raposa simboliza os indivíduos que, incapazes de superar o obstáculo, e não querendo aceitar o fracasso, tentam autooconvencer-se da não existência deste.
Procuram estratégias de justificação, lógicas e a posteriori, com o fim de evitar sentimentos de inferioridade que ponham em risco a auto-estima.
A racionalização inscreve-se numa forma de justificação a posteriori, com o fim de evitar sentimentos de inferioridade que ponham em risco a auto-estima. Racionalizando, apresentam-se argumentos justificativos de uma conclusão que, à partida, era tida como verdadeira.
É o que se passa quando os elementos de uma equipa desportiva perdem um desafio por manifesta incapacidade técnica e justificam o resultado apelando para factores como: mau tempo, parcialidade do árbitro em "casa" do adversário e outros. Também um aluno que presta uma má prova por deficiente preparação pode reagir à frustração apontando como motivos do insucesso uma má disposição ou uma elaboração incorrecta do enunciado do exercício.
Projecção
Um aluno que não gosta de um professor dirá que esse professor o detesta. Pais ambiciosos em relação aos filhos projectam neles o seu desejo de sucesso nunca alcançado. Ódios raciais podem ser projecções mútuas das próprias características negativas. Uma pessoa má e agressiva tende a ver os outros como maus e agressivos.
Estes comportamentos são exemplos típicos de reacções de projecção.
A Projecção apresenta-se como uma tendência que os seres humanos têm de atribuir aos outros comportamentos, sentimentos e desejos que, sendo deles próprios, são muitas vezes tidos como inaceitáveis.
O mecanismo de projecção observa-se em situações da vida corrente, acerca das quais se diz, em linguagem proverbial: "Não julgues os outros por ti". É um comportamento típico na sociedade e a sua ocorrência tem por objectivos desviar o eu de uma realidade que pensa ser desagradável, enviando para os outros os processos que diminuem ou provocam insatisfação.
Deslocamento
Uma criança, impedida pela mãe de brincar com os seus companheiros, reage, muitas vezes, destruindo os seus brinquedos ou outros objectos. O empregado que se incompatibiliza com o patrão, não podendo manifestar reacção aberta contra este, receando ser despedido, desloca a agressão para os seus familiares, companheiros de quarto, ou até para os seus subordinados.
Estes exemplos mostram que a agressão nem sempre é dirigida contra o objecto original da questão, ou seja, contra aquilo que causou a frustração, podendo ser deslocada para alvos substitutos. Trata-se, nestes casos, de um mecanismo de defesa do ego designado por deslocamento.
O deslocamento é pois um mecanismo libertador que ocorre quando um sujeito, não podendo atingir determinado objecto, o substitui por outro, sobre o qual descarrega as suas tensões acumuladas.
Há muitas circunstâncias em que o indivíduo substitui as manifestações abertas de agressão por formas mais subtis e dissimuladas.
Um caso extremo de deslocamento consiste na auto-agressão, caracterizada pelo facto de o indivíduo ser ao mesmo tempo agressor e agredido.
A agressão auto dirigida manifesta-se por comportamentos variados, desde sentimentos de culpa e remorsos, até à auto mutilação e suicídio.
Se frequentemente encontramos pessoas que se censuram a si mesmas por sofrerem frustrações, comportamentos como os segundos são mais raros e, quando surgem, inscrevem-se em condutas neuróticas do foro patológico.
Regressão
A criança frustrada pela diminuição de afecto provocada pelo nascimento de um irmão pode reagir através de condutas que vão do choramingar, chupar no dedo e enurese até recusar-se a comer e a andar sozinha. Tais comportamentos, impróprios para a idade da criança, designam-se por condutas regressivas.
A regressão é um mecanismo segundo o qual o indivíduo adopta formas de conduta próprias de estádios anteriores de desenvolvimento.
A psicanálise oferece-nos exemplos de adultos cujas condutas foram regredindo, chegando à incapacidade de realização das funções vitais. Para além de casos extremos, há pessoas que tentam fugir a responsabilidades, refugiando-se na passividade de comportamentos regressivos.
A doença torna-se um meio de atrair sobre si a atenção dos outros e ver-se cercado de cuidados e de consideração e de fazer reviver, assim, por meio de um substituto dos pais (médico, pessoal do hospital, pessoas à cabeceira), as relações infantis anteriores na família. Aliás a maior parte dessas doenças são imaginárias! http://www.psiquiatriageral.com.br/tema/paranoia.htm
Albert Collette, Introduction à la psychologie dynamique
As formas de comportamento regressivo surgem, segundo a perspectiva psicanalítica, ligadas a frustrações e conflitos infantis não resolvidos ou mal ultrapassados.
Compensação
Adler, discípulo de Freud, apresenta a compensação como meio de superar situações de inferioridade.
Efectivamente, um indivíduo com locomoção deficiente pode superar as suas limitações dedicando-se à investigação científica, à actividade literária, à pintura ou escultura, conseguindo, assim, auto-afirmar-se.
Inferioridades resultantes de uma deficiente integração social podem, em muitos indivíduos, ser compensadas por uma forma exibicionista de vestuário, de atitudes e comportamentos destinados a atrair a atenção sobre si.
A compensação é assim um mecanismo de defesa contra qualquer inferioridade fisiológica ou psicológica, seja ela real ou apenas sentida, que consiste na realização de outras actividades que permitem ao indivíduo sentir-se realizado.
Sublimação
A criança encontra no jogo um meio de se tomar "capitão de navio", "explorador", "chefe de equipa", reagindo, deste modo, a frustrações sofridas no grupo familiar ou escolar.
As aventuras fantásticas, vividas no jogo, compensam a adversidade e, por vezes, a hostilidade do meio social.
Vemos, portanto, que a compensação se pode ligar, nalguns casos, à fantasia.
Esta caracteriza-se por uma fuga à realidade e verifica-se sempre que o indivíduo recorre à ficção para suprir a vivência pouco gratificante de situações reais.
Esta forma de reacção consiste essencialmente na substituição do objecto-meta da pulsão por outro socialmente aceite.
Assim, a pulsão agressiva pode ser canalizada para o exercício de actividades desportivas que impliquem força, actividade intensa e consequente dispêndio de energias, como, por exemplo, o judo.
A sublimação apresenta-se como um mecanismo que consiste em substituir uma actividade socialmente inaceitável na comunidade por outra que é moralmente aceite e socialmente valorizada.
Freud considera que a sublimação é um mecanismo de defesa contra os impulsos sexuais e agressivos. Estes impulsos, deparando com a barreira estabelecida pelos códigos sociais e morais interiorizados pelo indivíduo, não podem concretizar-se livremente e, como tal, encaminham-se para actividades artísticas, culturais e outras, permitindo ao indivíduo desfazer tensões interiores, sem correr o risco de entrar em choque com os padrões habituais.
-Frustação/ Conflito
Frustração
Quando o indivíduo está motivado para atingir um dado objectivo, e por um obstáculo qualquer não o consegue atingir, vive um estado de frustração. Este sentimento depende de muitos factores: personalidade do sujeito, idade, natureza da motivação, tipo de obstáculo, etc.
Reacções à frustração. Não existe uma reacção tipo para determinada frustração, as respostas às frustrações dependem de muito factores como acima aludimos.
Comportamentos resultantes da frustração:
1.Agressão (directa ou deslocada). Esta agressão denomina-se directa quando é dirigida contra a fonte que provocou a frustração, e deslocada se se dirige para outras pessoas ou objectos. Ex. A criança agride o pai que a impede de brincar (agressão directa); A criança proibida de brincar, destrói os brinquedos com que o pai a impede de brincar (agressão deslocada).
Ao longo do processo de socialização, o indivíduo aprende a lidar com as frustrações, inibindo, deslocando, dissimulando, ou compensando as suas manifestações de agressividade. Em situações extremas, o individuo pode dirigir as suas manifestações de agressividade deslocada para ele próprio (auto-agressão).
2.Apatia (indiferença ou inactividade). Face a contínuas frustrações o indivíduo pode cair na reacção apática (indiferença perante a fonte da frustração). A pulsão motivadora do comportamento é reduzida ou eliminada.
Conflito
Estado de tensão que resulta de uma tensão interior vivida pelo sujeito quando se debate com motivações inconciliáveis.
Kurt Lewin classificou os conflitos em três grupos:
1.Conflito aproximação/ aproximação. Decisão sobre duas coisas desejáveis, mas incompatíveis. Ex.: Escolher entre uma festa e uma viagem.
2. Conflito afastamento/ aproximação. Decisão sobre algo que comporta aspecto positivos, mas também negativos. Ex. Fazer uma viagem, mas ficar sem dinheiro.
3.Conflito afastamento/ afastamento. Decisão sobre duas coisas igualmente desagradáveis, mas inevitáveis. Ex.: Para uma criança comer a sopa ou ir para a cama.
Quando o indivíduo está motivado para atingir um dado objectivo, e por um obstáculo qualquer não o consegue atingir, vive um estado de frustração. Este sentimento depende de muitos factores: personalidade do sujeito, idade, natureza da motivação, tipo de obstáculo, etc.
Reacções à frustração. Não existe uma reacção tipo para determinada frustração, as respostas às frustrações dependem de muito factores como acima aludimos.
Comportamentos resultantes da frustração:
1.Agressão (directa ou deslocada). Esta agressão denomina-se directa quando é dirigida contra a fonte que provocou a frustração, e deslocada se se dirige para outras pessoas ou objectos. Ex. A criança agride o pai que a impede de brincar (agressão directa); A criança proibida de brincar, destrói os brinquedos com que o pai a impede de brincar (agressão deslocada).
Ao longo do processo de socialização, o indivíduo aprende a lidar com as frustrações, inibindo, deslocando, dissimulando, ou compensando as suas manifestações de agressividade. Em situações extremas, o individuo pode dirigir as suas manifestações de agressividade deslocada para ele próprio (auto-agressão).
2.Apatia (indiferença ou inactividade). Face a contínuas frustrações o indivíduo pode cair na reacção apática (indiferença perante a fonte da frustração). A pulsão motivadora do comportamento é reduzida ou eliminada.
Conflito
Estado de tensão que resulta de uma tensão interior vivida pelo sujeito quando se debate com motivações inconciliáveis.
Kurt Lewin classificou os conflitos em três grupos:
1.Conflito aproximação/ aproximação. Decisão sobre duas coisas desejáveis, mas incompatíveis. Ex.: Escolher entre uma festa e uma viagem.
2. Conflito afastamento/ aproximação. Decisão sobre algo que comporta aspecto positivos, mas também negativos. Ex. Fazer uma viagem, mas ficar sem dinheiro.
3.Conflito afastamento/ afastamento. Decisão sobre duas coisas igualmente desagradáveis, mas inevitáveis. Ex.: Para uma criança comer a sopa ou ir para a cama.
-Conceito de motivação
Etimologicamente, "motivação" deriva da palavra latina "movere" que significa pôr em funcionamento, activar, mover. Daí que se fale de motivação a propósito de comportamentos em que existe um elemento energético que mobiliza o organismo para a acção e um elemento direccional que define o alvo, a meta ou o fim a atingir.
MOTIVAÇÃO
Conjunto de forças que sustentam, regulam e orientam as acções de um organismo para determinados fins.
Ciclo motivacional
Depois de ter consumido as reservas alimentares, o organismo reclama nova ingestão de alimentos – é a fome. O indivíduo sente uma força interna que o impele para a procura do alimento. Depois de o alcançar e ingerir, o organismo sente-se reequilibrado, desaparecendo a tensão inicial.
Encontramos neste comportamento um ciclo motivacional, constituído pelos seguintes elementos:
1- Necessidade, que é o estado de equilíbrio provocado por uma carência ou privação (falta de alimento).
2 -Impulso ou pulsão, que é caracterizada por um estado energético capaz de activar e dirigir o comportamento (força que move o indivíduo para obter comida).
3 Resposta, que consiste na actividade desenvolvida e desencadeada pela pulsão (procura de alimento).
4 Objectivo, que diz respeito à finalidade ou à meta que se procura atingir com a actividade (ingestão de alimento).
5 Saciedade, que se refere à redução ou eliminação da pulsão (depois do alimento ingerido, a fome atenua-se ou desaparece).
Saciedade
Necessidade
Impulso
Resposta
Objectivo
O conjunto destes elementos permite-nos compreender o comportamento motivado, que apresenta como principais características:
• É orientado para um fim e persiste até que o indivíduo atinja o objectivo.
• É activado e controlado por forças que podem ser internas ou externas, biológicas ou sociais, conscientes ou inconscientes.
• Apresenta variações de pessoa para pessoa e conforme o momento e as situações.
Quaisquer que sejam os comportamentos, todos eles andam associados a motivações específicas, constituídas por determinantes inatas ou adquiridas, fisiológicas ou sociais que, consciente ou inconscientemente, levam o indivíduo a comportar-se de dada forma. Mesmo quando o indivíduo julga conhecer perfeitamente os motivos que o levaram a agir de determinada maneira, pode haver razões ocultas de que nem ele próprio se apercebe.
Tipos de Motivação
O facto de existir uma extrema diversidade de motivos, e de eles interferirem reciprocamente uns sobre os outros, toma difícil e arriscada a tarefa de definir, delimitar e classificar de forma exacta as diferentes motivações.
Mesmo no que respeita a classificações gerais, os psicólogos não são unânimes, pelo que nos aparecem diferentes classificações, consoante a perspectiva em que o psicólogo se coloca e os critérios que utiliza ao classificar os motivos.
Ultrapassando a especificidade de cada uma delas e a variabilidade de termos utilizados pelos diferentes autores, poderemos constatar que, de um modo geral, todas elas apontam, no fundo, para uma diferenciação entre:
Motivações primárias e Motivações secundárias
Motivações fisiológicas e Motivações sociais
Motivações inatas e Motivações aprendidas
Motivações inatas
Actividades ligadas à fome, à sede, à respiração e à temperatura do corpo, são exemplos de comportamentos inscritos nas motivações inatas. Tendo na base necessidades que reclamam imperiosamente ser satisfeitas, estas motivações nascem com o indivíduo, manifestando-se independentemente de qualquer aprendizagem.
Trata-se de motivações fisiológicas, pois o mecanismo que desencadeia os comportamentos é de origem orgânica e os objectivos a alcançar consistem no restabelecimento do equilíbrio orgânico. Estas motivações inatas ou fisiológicas são comuns a todos os indivíduos, homens e animais, podendo ser interpretadas como mecanismos de defesa da integridade orgânica, na medida em que alertam o indivíduo para a urgência de realizar condutas indispensáveis para a sua sobrevivência. Por isso, mesmo que fosse possível a existência de um homem a viver isoladamente, ele teria absoluta necessidade de efectuar as actividades exigidas por este tipo de motivações.
Seguidamente, ocupar-nos-emos da análise da fome e da sede, exemplos de motivações inatas que se integram naquilo que se designa também por impulsos homeostáticos.
Homeostasia
Para que o organismo possa sobreviver tem de funcionar equilibradamente.
Se a todo o momento está sujeito a desequilíbrio, tem necessidade de actividades compensatórias capazes de refazer o equilíbrio inicial. Deste modo, quando tem fome ou sede, o indivíduo procura os meios de satisfazer tais necessidades.
O processo regulador que estabelece o equilíbrio do funcionamento orgânico chama-se homeostasia e pode ser esquematizado da seguinte forma:
Necessidade → Pulsão → Objectivo
↑ ↓
← ← ←
A uma necessidade orgânica corresponde uma pulsão desencadeadora de actividades orientadas para um objectivo específico. Uma vez atingido o objectivo, a necessidade é satisfeita (saciedade) e a pulsão correspondente desaparece.
HOMEOSTASIA
Tendência do organismo em manter a constância do seu equilíbrio funcional, ou em actuar de modo a repô-lo se este for perturbado.
A homeostasia verificada no organismo assemelha-se ao sistema de controlo utilizado nos cilindros de aquecimento de água. Quando a temperatura da água baixa, o termóstato liga o mecanismo que a fará aquecer; se a temperatura da água atingir grau elevado, o termóstato cortará, automaticamente, a ligação à fonte de calor.
É ao fisiólogo Cannon que se deve a utilização deste termo no domínio do organismo. É sua a seguinte afirmação: "O ser vivo é um organismo feito de tal modo que cada influência nociva desencadeia uma actividade de compensação para neutralizar ou reparar os danos".
A reparação dos danos referida por Cannon pode começar a ser feita por processos fisiológicos espontâneos. É o caso da transpiração e das tremuras que ocorrem quando o corpo está exposto, respectivamente, a temperaturas elevadas ou demasiadamente baixas.
Ora, estes processos naturais nem sempre são suficientes para o restabelecimento do equilíbrio, pelo que o indivíduo tem de executar actividades suplementares. Assim, se está frio, veste roupas mais quentes, aproxima-se de fontes caloríficas e aumenta as reservas energéticas, pela ingestão de maior quantidade de alimentos. Se está calor, usa menos roupas, procura lugares frescos, diminui a quantidade de alimentos e bebe mais água para compensar a perda de líquido.
Convém notar que nem todas as necessidades produzem impulsos tendentes à restauração do equilíbrio orgânico. Dois exemplos comprovativos podem ser apresentados:
Se um indivíduo ligar o motor do automóvel numa garagem sem aberturas, pode morrer asfixiado devido à inalação de monóxido de carbono, na medida em que a necessidade de oxigénio não desencadeia impulso activador de um comportamento que vise a sua obtenção.
Também os aviadores, a grande altitude, necessitam de consultar o altímetro para saberem quando devem colocar a máscara de oxigénio.
Fome
Durante muito tempo se pensou que a procura do alimento se devia à sensação de aperto provocada pelas contracções musculares do estômago.
Contudo, investigações mais recentes demonstram que o impulso da fome se desencadeia, mesmo em indivíduos que sofreram a ablação do estômago.
• Hoje em dia, considera-se que, para além das contracções musculares estomacais, a procura de alimento é uma actividade desencadeada por alterações na composição química do sangue que estimulam centros específicos situados no hipotálamo.
Na base desta constatação, estão algumas experiências feitas com animais.
Assim, verificou-se que quando um cão faminto recebia sangue de um cão saciado, as contracções cessavam no estômago do primeiro. Também se verificou que quando se fazia a transfusão inversa, ou seja, de um cão faminto para um saciado, este manifestava as referidas contracções.
Na zona hipotalâmica, situam-se dois centros controladores do comportamento alimentar: um inibidor, outro activador. A lesão do primeiro centro num rato provoca-lhe um extraordinário aumento de peso, porque nunca se sacia e, como tal, não pára de comer. A lesão do segundo provoca a morte ao referido animal, por não sentir fome e deixar de se alimentar.
• Se bem que animais, e mesmo bebés, a quem se permitiu a escolha entre uma grande variedade de alimentos, tenham sido capazes de encontrar uma dieta adequada, em crianças e no adulto, as preferências alimentares resultam, em grande parte, da aprendizagem de costumes sociais.
Sede
Quando a quantidade de água existente no nosso corpo diminui, sentimos a boca e a garganta ressequidas.
Será lícito concluir que reside na boca ou na garganta secas a causa do impulso da sede?
Nesse caso, se as glândulas salivares deixassem de funcionar, o impulso da sede seria mais intenso.
Ora, experiências realizadas por Montgomery, consistindo na ablação de glândulas salivares em cães, mostraram que estes não passaram a consumir maior quantidade de água do que anteriormente.
Não é, portanto, a secura da boca ou da garganta que determinam o impulso da sede.
Pensou-se também que o mecanismo da sede dependesse do estômago.
Bellows fez um corte no esófago de um cão, de molde a impedir a ligação da garganta com o estômago. A água que o cão bebia saía para o exterior através da abertura do esófago.
Sem que o líquido chegasse ao estômago, o cão continuava capaz de avaliar a quantidade de água a ingerir, correspondente à necessidade do organismo.
Para que o cão não sucumbisse, era-lhe fornecido, posteriormente, líquido pela parte inferior do esófago em ligação com o estômago.
Podemos, pois, concluir que o mecanismo regulador da sede é também distinto do estômago.
• Tal como acontece na fome, o impulso que nos leva a ingerir uma dada quantidade de líquido é coordenado por uma zona hipotalâmica. A comprovar, basta referir que, se injectarmos nessa área uma solução salina, o animal tornar-se-á sequioso. Se, pelo contrário, a injecção for de água pura, o animal sequioso ficará saciado.
• Também na eliminação da sede se utilizam meios diferentes (água, vinho, cerveja, sumos, chá, etc.) dependentes da aprendizagem e dos costumes sociais.
Motivações aprendidas
Comportamentos que visam a auto-afirmação, o poder, a competição, a afiliação, o prestígio e o sucesso incluem-se no tipo de motivações aprendidas.
Estas nascem e desenvolvem-se pela aprendizagem que os indivíduos fazem em contacto com os outros elementos do grupo social. Adquiridas por aprendizagem social, são motivações de natureza social e visam a inserção do indivíduo no grupo.
Não se pode afirmar que determinada motivação aprendida esteja presente em todos os seres humanos, pois que se trata de necessidades que não só têm a marca da relatividade cultural, como ainda, dentro da mesma cultura, dependem das aprendizagens e experiências de cada um.
O desejo de competir, de auto-afirmar-se e de ter prestígio só existem porque os seres humanos vivem em comunidade e regem as suas condutas por padrões socioculturais. Além disso, estas motivações visam compensações de natureza essencialmente psicológico-social. De imediato, trataremos algumas motivações aprendidas, como sejam a necessidade de afiliação, de prestígio e de sucesso.
Necessidade de afiliação
Mais do que qualquer outro, o ser humano é um animal gregário.
O facto de o homem ser um animal gregário explica-nos, até certo ponto, a existência de comportamentos cujos motivos emergem das suas vivências sociais. Trata-se de comportamentos que não ocorreriam se vivesse só.
O medo da solidão e a necessidade de se associar a outrem constituem aspectos com que Atkinson e MacClelland se referem à necessidade de afiliação.
AFILIAÇÃO
Necessidade de estabelecer e conservar relações positivas de afecto com as outras pessoas e de se sentir aceite e amado por elas.
O desejo de afiliação é um dos mais sólidos suportes do grupo social. De facto, ele está na base da coesão grupal e permite compreender a fidelidade que se estabelece entre os diferentes elementos do grupo.
Na convivência com os outros, o ser humano é pressionado pelos grupos em que se integra para executar actos aceitáveis e inibir actos indesejáveis. É afectado por toda uma estrutura cultural de que se destacam, por exemplo, as crenças, as opiniões, os costumes e as tradições, transmitidos, a partir da infância, pela família, pela escola e outras instituições.
O indivíduo enfrenta, pois, um conflito, na medida em que se sente motivado para executar actos dos quais resulta principalmente uma satisfação pessoal, mas cujo controlo e inibição lhe são exigidos pela necessidade de ser aceite pelos outros. Do equilíbrio destas forças motivadoras resulta a adaptação social.
Nem sempre as pressões sociais se mostram eficazes no que respeita à consecução de um comportamento socialmente adaptado.
Muitas vezes, o indivíduo assume atitudes opostas às vigentes no seu grupo social. Rejeita as normas socialmente aceites, revoltando-se contra costumes e tradições, chegando até a adoptar formas violentas de conduta em relação a tudo aquilo que é autoridade social. Trata-se de comportamentos em que o desejo de afiliação é ultrapassado, dando lugar a formas de inconformismo e desobediência.
Outros casos existem em que o desejo de afiliação leva a uma extrema submissão aos outros. Referimo-nos a indivíduos com tal grau de conformismo e obediência que são incapazes de exprimir opiniões ou tomar atitudes que estejam em desacordo com o grupo de que se sentem dependentes. Incapazes de tomar decisões por si sós, curvam-se às exigências dos outros, esperando ver agir para saber como agir. Fugindo à rejeição social com medidas meramente defensivas, as condutas destas pessoas não são bons exemplos de comportamentos socialmente adaptados.
Necessidade de prestígio
Na sua actuação em grupo, o indivíduo tem sempre como objectivo construir, manter e ampliar o seu estatuto social. Sabemos bem como o luxo, o dinheiro e a posse de outros bens são alguns dos fins visados por indivíduos que vêem neles o acesso ao estatuto de uma classe privilegiada.
Se observarmos a sociedade em que nos inserimos, damos conta que, em muitas circunstâncias, os indivíduos actuam movidos por desejos que visam:
• Obter determinado estatuto social.
• Auto-afirmar-se.
• Ser considerado.
• Ser superior aos outros.
• Ser empreendedor.
• Ser alvo das atenções.
• Ser admirado.
• Possuir poder.
• Ser apreciado.
• Ser competente.
• Ser respeitado.
• Ser popular.
Esta lista de objectivos não é exaustiva, mas exemplifica bem a necessidade de prestígio ou auto-afirmação que as pessoas têm, e que é uma motivação que se liga ao estatuto, ou seja, à posição que a pessoa ocupa face ao grupo social.
PRESTÍGIO
Necessidade de ser tido em elevada consideração ou estima pelos colegas e pela comunidade em geral.
Em muitos casos, a aspiração a um estatuto superior radica no desejo de se impor e mesmo de exercer domínio sobre os outros.
Atkinson e MacClelland definem o desejo de granjear o poder como a preocupação de exercer controlo sobre os meios de influenciar os outros e, em especial, como o gosto de dar ordens e de as fazer cumprir.
Necessidade de realização ou de sucesso
O sucesso ou motivo de realização aparece sempre que uma pessoa sabe que o seu comportamento está a ser avaliado segundo padrões de excelência e que as consequências podem ser favoráveis – sucesso ou êxito – ou, então, desfavoráveis – insucesso ou fracasso.
MOTIVAÇÃO PARA O SUCESSO
Necessidade que leva as pessoas a empenharem-se em tarefas difíceis com vista a prosseguir objectivos que são por elas encarados como um desafio.
A dificuldade de certas tarefas funciona em relação às pessoas que sentem esta motivação como um activador ou desencadeador de uma força interna que as leva a apostar na sua realização. As pessoas assim vocacionadas aceitam assumir a responsabilidade de executar os actos necessários para a consecução dos objectivos visados, o que implica correr o risco de falhar. Assim, desejar sucesso tem como contraponto uma outra motivação, que é o medo de fracassar.
• Daí que as pessoas com alta motivação para o sucesso sejam geralmente realistas, sendo moderadas na escolha das metas que pretendem atingir. Se as tarefas demasiado simples não constituem para elas um desafio, também o não constitui a escolha de tarefas muito difíceis. É que, no primeiro caso, fazer o que toda a gente é capaz de fazer não granjeia sucesso. No segundo, são poucas as hipóteses de êxito.
• Diferentemente, as pessoas dominadas pelo medo do fracasso preferem tarefas muito fáceis ou muito difíceis. As primeiras dão-lhes a garantia de não falhar; as segundas não lhes provocam ansiedade por não ser motivo de vergonha fracassar em tarefas que só poucas pessoas conseguem desempenhar.
As pessoas motivadas para o sucesso são, na sua grande maioria, pessoas empreendedoras, apresentando como características fundamentais:
• Gosto em assumir riscos.
• Confiança na capacidade de ser bem sucedido.
• Empenhamento em acções voltadas para o êxito pessoal.
• Desejo de liberdade e responsabilidade individual.
• Vontade de atingir padrões de excelência.
Pessoas com estas características são dotadas de espírito de iniciativa, constituindo-se como líderes carismáticos nos mais variados campos: política, economia, arte, educação, ciência e gestão empresarial.
Motivações combinadas
A fome e a sede foram incluídas na categoria das motivações fisiológicas, porque são reguladas por mecanismos biológicos inatos desencadeadores de impulsos homeostáticos. Estes resultam de carências fisiológicas e impulsionam o indivíduo para comportamentos que virão restabelecer o equilíbrio interno, necessário à sobrevivência do organismo.
O impulso sexual e o impulso maternal a nível da espécie humana são designados por motivações combinadas porque, tal como as fisiológicas, dependem de mecanismos biológicos inatos e, tal como as motivações aprendidas, dependem de outros factores, especialmente dos padrões culturais vigentes nas diversas comunidades.
A diferença entre motivações fisiológicas e motivações combinadas parece, à primeira vista, imperceptível ou mesmo inexistente. Todavia, muitos psicólogos explicitam algumas diferenças, entre as quais destacamos:
• Sexo e impulso maternal têm base biológica inata, mas não são impulsos homeostáticos. Não surgem como resultado de carências orgânicas perturbadoras do equilíbrio homeostático e susceptíveis de pôr em risco a sobrevivência.
De facto, se a fome ou a sede reclamam comportamentos tendentes a satisfazê-las, sob o risco da perda da sobrevivência, a não satisfação do impulso sexual não acarreta a morte do indivíduo.
• Sexo e impulso maternal são afectados pelos factores sociais num grau muito mais elevado que a fome e a sede.
Concluindo, as pessoas quase não diferem no modo como satisfazem a necessidade de oxigénio; já diferem muito na procura da comida; diferem ainda muito mais no modo como se relacionam sexualmente e como "amam" e cuidam dos filhos.
Motivação sexual
O impulso sexual gera também uma energia que leva o indivíduo a desenvolver comportamentos para satisfazer a necessidade, posto o que cessa o impulso. Nos animais, impulso, cortejamento e coito processam-se segundo mecanismos naturais, inatos, instintivos e de natureza essencialmente orgânica. No homem, os caracteres inatos e orgânicos manifestam-se essencialmente a nível do impulso, mas o cortejamento e o acto sexual obedecem a imperativos de natureza sociocultural.
Quer o hipotálamo, quer as hormonas produzidas pelas gónadas e hipófise interferem no controlo da actividade sexual.
Porém, no homem, mais importante que esta base fisiológica e inata, são os factores aprendidos no contexto cultural. É que o ser humano possui uma dimensão histórica, abarcando com o peso de uma tradição social, portadora de regras de conduta que se lhe impõem logo após o nascimento.
É assim que a resposta fisiológica, directa e instintiva, vai sendo substituída por outra menos natural, mas de acordo com normas ditadas pelo contexto social em que se desenvolve o indivíduo. Tais normas constituem um todo complexo de que evidenciamos, por exemplo, as crenças e os costumes, o direito e a moral.
Ora, como estes aspectos carecem de universalidade, o comportamento sexual manifesta-se das formas mais variadas e heterogéneas.
Na nossa sociedade, espera-se que o homem tome a iniciativa, convidando a mulher para sair, oferecendo-lhe presentes e pedindo-a em casamento. O mesmo não acontece com os Goajiros, Índios da América do Sul, em que é a mulher que, ao rasteirar o homem durante uma dança ritual, lhe demonstra, assim, o seu interesse.
Estas diferenças de conduta sexual bastam para mostrar como as motivações de origem biológica são modificadas e condicionadas por factores externos, de Índole sociocultural.
O próprio desencadeamento do impulso sexual depende de estímulos ambientais.
Nas espécies animais há certos sinais que atraem os parceiros ou indicam a sua receptividade sexual. Na altura própria, alguns animais emitem naturalmente odores característicos, outros alteram a cor da pele, outros ainda movimentam-se segundo um padrão típico da espécie.
Nos seres humanos, os sinais sexuais são totalmente aprendidos. Entre estes sinais incluem-se todos os aspectos relacionados com o que é fisicamente atraente e que são, como sabemos, especificamente culturais. Por exemplo, nos nossos dias a magreza é considerada "sexy", mas se recuarmos uns anos, sabemos bem que ninguém punha em causa a afirmação de que "gordura é formosura". Outros sinais sexuais comuns na nossa sociedade têm muito a ver com o uso de jóias, maquilhagem, perfumes, roupas, gestos, posturas corporais, olhares e outras expressões fisionómicas. Os filmes eróticos e pornográficos ou outras impigens sexuais surtem também efeitos no despertar do desejo sexual.
O comportamento sexual envolve ainda elementos psicológicos fundamentais, constituídos por diversas emoções e sentimentos. No relacionamento sexual dos jovens adultos, a atracção física e o desejo de prazer predominam mas, à medida que o relacionamento se desenvolve e amadurece, outros sentimentos vão desempenhando um papel cada vez mais importante. No relacionamento sexual posterior, a atracção sexual associa-se à afeição, ao amor, ao companheirismo, à estima, à protecção, sentimentos fundamentais para que tal relacionamento se torne estável e duradoiro.
Comportamento maternal
A preservação das espécies depende dos comportamentos maternal e sexual. Se o comportamento sexual conduz à reprodução, o maternal leva à prestação dos cuidados necessários para que os descendentes se tornem aptos a viver em autonomia.
Nos animais estas condutas têm origem instintiva, embora alguns mamíferos, como os macacos, necessitem de algumas aprendizagens.
Nos seres humanos, o comportamento maternal implica condutas diversas que visam os cuidados com a alimentação, a higiene, a protecção e a educação, e envolve ainda um conjunto de sentimentos como o carinho, ternura, atenção, afecto e dedicação. Uns e outros são aprendidos no contexto social, pelo que tratar dos filhos é algo que só é possível após uma aprendizagem que mãe e pai têm de efectuar.
No que respeita à nossa sociedade, o conceito de cuidados maternos tem vindo a sofrer alterações ao longo do tempo e como "ser mãe" implica uma decisão pensada em função de condicionalismos de natureza social.
É óbvio que o comportamento maternal conta com alguns factores de natureza biológica que ocorrem durante a gravidez e amamentação.
Com o prosseguimento da gravidez, o sistema hormonal começa a desempenhar funções importantes no comportamento maternal. Assim, a progesterona segregada pelos ovários provoca o desenvolvimento das glândulas mamárias. No final da gravidez, a hipófise, estimulada pela presença do feto no útero começa a produzir prolactina, que, por sua vez, vai estimular as glândulas mamárias relativamente à produção de leite para a alimentação do bebé.
Contudo, estas modificações fisiológicas não criam na mãe o desejo de amamentar o filho, nem desencadeiam qualquer outro comportamento tendente a cuidar dele. Tais comportamentos devem-se sobretudo a factores ligados à aprendizagem social, pelo que uma mulher que nunca tenha observado como se cuida de um recém-nascido, se vier a ter um filho não saberá tratar dele.
Até agora, ao falarmos de comportamento maternal referimo-nos sempre à mulher que carrega o filho no ventre durante nove meses e que dele cuida durante a infância. Contudo, as expressões "comportamento maternal", "amor materno" e "impulso maternal" têm hoje um sentido muito mais amplo.
• Se analisarmos o que se passa noutras sociedades, constataremos que o modo de tratar as crianças apresenta enormes variações, algumas das quais nos repugna considerá-las como "comportamento maternal".
Segundo Margaret Mead, entre os Mundugumores, as crianças são rispidamente tratadas desde o nascimento. Precisam de lutar para que as mães as deixem mamar ao peito e crescem sem afecto e entregues a si próprias.
• Os cuidados maternos podem ser partilhados ou mesmo integralmente assumidos pelo pai, quer por livre escolha ou por temperamento, quer por razões ligadas às profissões exercidas pelo casal, por morte da mãe ou por motivos de divórcio.
• Mulheres que nunca tiveram filhos podem exercer o papel de mãe tão bem ou até melhor do que as mães biológicas. As mães adoptivas são exemplo claro de que a prestação de cuidados e o amor que se dedica aos filhos não dependem de laços biológicos ou naturais, mas de laços psicológicos que se constroem nas interacções socio-afectivas mãe-bebé.
MOTIVAÇÃO
Conjunto de forças que sustentam, regulam e orientam as acções de um organismo para determinados fins.
Ciclo motivacional
Depois de ter consumido as reservas alimentares, o organismo reclama nova ingestão de alimentos – é a fome. O indivíduo sente uma força interna que o impele para a procura do alimento. Depois de o alcançar e ingerir, o organismo sente-se reequilibrado, desaparecendo a tensão inicial.
Encontramos neste comportamento um ciclo motivacional, constituído pelos seguintes elementos:
1- Necessidade, que é o estado de equilíbrio provocado por uma carência ou privação (falta de alimento).
2 -Impulso ou pulsão, que é caracterizada por um estado energético capaz de activar e dirigir o comportamento (força que move o indivíduo para obter comida).
3 Resposta, que consiste na actividade desenvolvida e desencadeada pela pulsão (procura de alimento).
4 Objectivo, que diz respeito à finalidade ou à meta que se procura atingir com a actividade (ingestão de alimento).
5 Saciedade, que se refere à redução ou eliminação da pulsão (depois do alimento ingerido, a fome atenua-se ou desaparece).
Saciedade
Necessidade
Impulso
Resposta
Objectivo
O conjunto destes elementos permite-nos compreender o comportamento motivado, que apresenta como principais características:
• É orientado para um fim e persiste até que o indivíduo atinja o objectivo.
• É activado e controlado por forças que podem ser internas ou externas, biológicas ou sociais, conscientes ou inconscientes.
• Apresenta variações de pessoa para pessoa e conforme o momento e as situações.
Quaisquer que sejam os comportamentos, todos eles andam associados a motivações específicas, constituídas por determinantes inatas ou adquiridas, fisiológicas ou sociais que, consciente ou inconscientemente, levam o indivíduo a comportar-se de dada forma. Mesmo quando o indivíduo julga conhecer perfeitamente os motivos que o levaram a agir de determinada maneira, pode haver razões ocultas de que nem ele próprio se apercebe.
Tipos de Motivação
O facto de existir uma extrema diversidade de motivos, e de eles interferirem reciprocamente uns sobre os outros, toma difícil e arriscada a tarefa de definir, delimitar e classificar de forma exacta as diferentes motivações.
Mesmo no que respeita a classificações gerais, os psicólogos não são unânimes, pelo que nos aparecem diferentes classificações, consoante a perspectiva em que o psicólogo se coloca e os critérios que utiliza ao classificar os motivos.
Ultrapassando a especificidade de cada uma delas e a variabilidade de termos utilizados pelos diferentes autores, poderemos constatar que, de um modo geral, todas elas apontam, no fundo, para uma diferenciação entre:
Motivações primárias e Motivações secundárias
Motivações fisiológicas e Motivações sociais
Motivações inatas e Motivações aprendidas
Motivações inatas
Actividades ligadas à fome, à sede, à respiração e à temperatura do corpo, são exemplos de comportamentos inscritos nas motivações inatas. Tendo na base necessidades que reclamam imperiosamente ser satisfeitas, estas motivações nascem com o indivíduo, manifestando-se independentemente de qualquer aprendizagem.
Trata-se de motivações fisiológicas, pois o mecanismo que desencadeia os comportamentos é de origem orgânica e os objectivos a alcançar consistem no restabelecimento do equilíbrio orgânico. Estas motivações inatas ou fisiológicas são comuns a todos os indivíduos, homens e animais, podendo ser interpretadas como mecanismos de defesa da integridade orgânica, na medida em que alertam o indivíduo para a urgência de realizar condutas indispensáveis para a sua sobrevivência. Por isso, mesmo que fosse possível a existência de um homem a viver isoladamente, ele teria absoluta necessidade de efectuar as actividades exigidas por este tipo de motivações.
Seguidamente, ocupar-nos-emos da análise da fome e da sede, exemplos de motivações inatas que se integram naquilo que se designa também por impulsos homeostáticos.
Homeostasia
Para que o organismo possa sobreviver tem de funcionar equilibradamente.
Se a todo o momento está sujeito a desequilíbrio, tem necessidade de actividades compensatórias capazes de refazer o equilíbrio inicial. Deste modo, quando tem fome ou sede, o indivíduo procura os meios de satisfazer tais necessidades.
O processo regulador que estabelece o equilíbrio do funcionamento orgânico chama-se homeostasia e pode ser esquematizado da seguinte forma:
Necessidade → Pulsão → Objectivo
↑ ↓
← ← ←
A uma necessidade orgânica corresponde uma pulsão desencadeadora de actividades orientadas para um objectivo específico. Uma vez atingido o objectivo, a necessidade é satisfeita (saciedade) e a pulsão correspondente desaparece.
HOMEOSTASIA
Tendência do organismo em manter a constância do seu equilíbrio funcional, ou em actuar de modo a repô-lo se este for perturbado.
A homeostasia verificada no organismo assemelha-se ao sistema de controlo utilizado nos cilindros de aquecimento de água. Quando a temperatura da água baixa, o termóstato liga o mecanismo que a fará aquecer; se a temperatura da água atingir grau elevado, o termóstato cortará, automaticamente, a ligação à fonte de calor.
É ao fisiólogo Cannon que se deve a utilização deste termo no domínio do organismo. É sua a seguinte afirmação: "O ser vivo é um organismo feito de tal modo que cada influência nociva desencadeia uma actividade de compensação para neutralizar ou reparar os danos".
A reparação dos danos referida por Cannon pode começar a ser feita por processos fisiológicos espontâneos. É o caso da transpiração e das tremuras que ocorrem quando o corpo está exposto, respectivamente, a temperaturas elevadas ou demasiadamente baixas.
Ora, estes processos naturais nem sempre são suficientes para o restabelecimento do equilíbrio, pelo que o indivíduo tem de executar actividades suplementares. Assim, se está frio, veste roupas mais quentes, aproxima-se de fontes caloríficas e aumenta as reservas energéticas, pela ingestão de maior quantidade de alimentos. Se está calor, usa menos roupas, procura lugares frescos, diminui a quantidade de alimentos e bebe mais água para compensar a perda de líquido.
Convém notar que nem todas as necessidades produzem impulsos tendentes à restauração do equilíbrio orgânico. Dois exemplos comprovativos podem ser apresentados:
Se um indivíduo ligar o motor do automóvel numa garagem sem aberturas, pode morrer asfixiado devido à inalação de monóxido de carbono, na medida em que a necessidade de oxigénio não desencadeia impulso activador de um comportamento que vise a sua obtenção.
Também os aviadores, a grande altitude, necessitam de consultar o altímetro para saberem quando devem colocar a máscara de oxigénio.
Fome
Durante muito tempo se pensou que a procura do alimento se devia à sensação de aperto provocada pelas contracções musculares do estômago.
Contudo, investigações mais recentes demonstram que o impulso da fome se desencadeia, mesmo em indivíduos que sofreram a ablação do estômago.
• Hoje em dia, considera-se que, para além das contracções musculares estomacais, a procura de alimento é uma actividade desencadeada por alterações na composição química do sangue que estimulam centros específicos situados no hipotálamo.
Na base desta constatação, estão algumas experiências feitas com animais.
Assim, verificou-se que quando um cão faminto recebia sangue de um cão saciado, as contracções cessavam no estômago do primeiro. Também se verificou que quando se fazia a transfusão inversa, ou seja, de um cão faminto para um saciado, este manifestava as referidas contracções.
Na zona hipotalâmica, situam-se dois centros controladores do comportamento alimentar: um inibidor, outro activador. A lesão do primeiro centro num rato provoca-lhe um extraordinário aumento de peso, porque nunca se sacia e, como tal, não pára de comer. A lesão do segundo provoca a morte ao referido animal, por não sentir fome e deixar de se alimentar.
• Se bem que animais, e mesmo bebés, a quem se permitiu a escolha entre uma grande variedade de alimentos, tenham sido capazes de encontrar uma dieta adequada, em crianças e no adulto, as preferências alimentares resultam, em grande parte, da aprendizagem de costumes sociais.
Sede
Quando a quantidade de água existente no nosso corpo diminui, sentimos a boca e a garganta ressequidas.
Será lícito concluir que reside na boca ou na garganta secas a causa do impulso da sede?
Nesse caso, se as glândulas salivares deixassem de funcionar, o impulso da sede seria mais intenso.
Ora, experiências realizadas por Montgomery, consistindo na ablação de glândulas salivares em cães, mostraram que estes não passaram a consumir maior quantidade de água do que anteriormente.
Não é, portanto, a secura da boca ou da garganta que determinam o impulso da sede.
Pensou-se também que o mecanismo da sede dependesse do estômago.
Bellows fez um corte no esófago de um cão, de molde a impedir a ligação da garganta com o estômago. A água que o cão bebia saía para o exterior através da abertura do esófago.
Sem que o líquido chegasse ao estômago, o cão continuava capaz de avaliar a quantidade de água a ingerir, correspondente à necessidade do organismo.
Para que o cão não sucumbisse, era-lhe fornecido, posteriormente, líquido pela parte inferior do esófago em ligação com o estômago.
Podemos, pois, concluir que o mecanismo regulador da sede é também distinto do estômago.
• Tal como acontece na fome, o impulso que nos leva a ingerir uma dada quantidade de líquido é coordenado por uma zona hipotalâmica. A comprovar, basta referir que, se injectarmos nessa área uma solução salina, o animal tornar-se-á sequioso. Se, pelo contrário, a injecção for de água pura, o animal sequioso ficará saciado.
• Também na eliminação da sede se utilizam meios diferentes (água, vinho, cerveja, sumos, chá, etc.) dependentes da aprendizagem e dos costumes sociais.
Motivações aprendidas
Comportamentos que visam a auto-afirmação, o poder, a competição, a afiliação, o prestígio e o sucesso incluem-se no tipo de motivações aprendidas.
Estas nascem e desenvolvem-se pela aprendizagem que os indivíduos fazem em contacto com os outros elementos do grupo social. Adquiridas por aprendizagem social, são motivações de natureza social e visam a inserção do indivíduo no grupo.
Não se pode afirmar que determinada motivação aprendida esteja presente em todos os seres humanos, pois que se trata de necessidades que não só têm a marca da relatividade cultural, como ainda, dentro da mesma cultura, dependem das aprendizagens e experiências de cada um.
O desejo de competir, de auto-afirmar-se e de ter prestígio só existem porque os seres humanos vivem em comunidade e regem as suas condutas por padrões socioculturais. Além disso, estas motivações visam compensações de natureza essencialmente psicológico-social. De imediato, trataremos algumas motivações aprendidas, como sejam a necessidade de afiliação, de prestígio e de sucesso.
Necessidade de afiliação
Mais do que qualquer outro, o ser humano é um animal gregário.
O facto de o homem ser um animal gregário explica-nos, até certo ponto, a existência de comportamentos cujos motivos emergem das suas vivências sociais. Trata-se de comportamentos que não ocorreriam se vivesse só.
O medo da solidão e a necessidade de se associar a outrem constituem aspectos com que Atkinson e MacClelland se referem à necessidade de afiliação.
AFILIAÇÃO
Necessidade de estabelecer e conservar relações positivas de afecto com as outras pessoas e de se sentir aceite e amado por elas.
O desejo de afiliação é um dos mais sólidos suportes do grupo social. De facto, ele está na base da coesão grupal e permite compreender a fidelidade que se estabelece entre os diferentes elementos do grupo.
Na convivência com os outros, o ser humano é pressionado pelos grupos em que se integra para executar actos aceitáveis e inibir actos indesejáveis. É afectado por toda uma estrutura cultural de que se destacam, por exemplo, as crenças, as opiniões, os costumes e as tradições, transmitidos, a partir da infância, pela família, pela escola e outras instituições.
O indivíduo enfrenta, pois, um conflito, na medida em que se sente motivado para executar actos dos quais resulta principalmente uma satisfação pessoal, mas cujo controlo e inibição lhe são exigidos pela necessidade de ser aceite pelos outros. Do equilíbrio destas forças motivadoras resulta a adaptação social.
Nem sempre as pressões sociais se mostram eficazes no que respeita à consecução de um comportamento socialmente adaptado.
Muitas vezes, o indivíduo assume atitudes opostas às vigentes no seu grupo social. Rejeita as normas socialmente aceites, revoltando-se contra costumes e tradições, chegando até a adoptar formas violentas de conduta em relação a tudo aquilo que é autoridade social. Trata-se de comportamentos em que o desejo de afiliação é ultrapassado, dando lugar a formas de inconformismo e desobediência.
Outros casos existem em que o desejo de afiliação leva a uma extrema submissão aos outros. Referimo-nos a indivíduos com tal grau de conformismo e obediência que são incapazes de exprimir opiniões ou tomar atitudes que estejam em desacordo com o grupo de que se sentem dependentes. Incapazes de tomar decisões por si sós, curvam-se às exigências dos outros, esperando ver agir para saber como agir. Fugindo à rejeição social com medidas meramente defensivas, as condutas destas pessoas não são bons exemplos de comportamentos socialmente adaptados.
Necessidade de prestígio
Na sua actuação em grupo, o indivíduo tem sempre como objectivo construir, manter e ampliar o seu estatuto social. Sabemos bem como o luxo, o dinheiro e a posse de outros bens são alguns dos fins visados por indivíduos que vêem neles o acesso ao estatuto de uma classe privilegiada.
Se observarmos a sociedade em que nos inserimos, damos conta que, em muitas circunstâncias, os indivíduos actuam movidos por desejos que visam:
• Obter determinado estatuto social.
• Auto-afirmar-se.
• Ser considerado.
• Ser superior aos outros.
• Ser empreendedor.
• Ser alvo das atenções.
• Ser admirado.
• Possuir poder.
• Ser apreciado.
• Ser competente.
• Ser respeitado.
• Ser popular.
Esta lista de objectivos não é exaustiva, mas exemplifica bem a necessidade de prestígio ou auto-afirmação que as pessoas têm, e que é uma motivação que se liga ao estatuto, ou seja, à posição que a pessoa ocupa face ao grupo social.
PRESTÍGIO
Necessidade de ser tido em elevada consideração ou estima pelos colegas e pela comunidade em geral.
Em muitos casos, a aspiração a um estatuto superior radica no desejo de se impor e mesmo de exercer domínio sobre os outros.
Atkinson e MacClelland definem o desejo de granjear o poder como a preocupação de exercer controlo sobre os meios de influenciar os outros e, em especial, como o gosto de dar ordens e de as fazer cumprir.
Necessidade de realização ou de sucesso
O sucesso ou motivo de realização aparece sempre que uma pessoa sabe que o seu comportamento está a ser avaliado segundo padrões de excelência e que as consequências podem ser favoráveis – sucesso ou êxito – ou, então, desfavoráveis – insucesso ou fracasso.
MOTIVAÇÃO PARA O SUCESSO
Necessidade que leva as pessoas a empenharem-se em tarefas difíceis com vista a prosseguir objectivos que são por elas encarados como um desafio.
A dificuldade de certas tarefas funciona em relação às pessoas que sentem esta motivação como um activador ou desencadeador de uma força interna que as leva a apostar na sua realização. As pessoas assim vocacionadas aceitam assumir a responsabilidade de executar os actos necessários para a consecução dos objectivos visados, o que implica correr o risco de falhar. Assim, desejar sucesso tem como contraponto uma outra motivação, que é o medo de fracassar.
• Daí que as pessoas com alta motivação para o sucesso sejam geralmente realistas, sendo moderadas na escolha das metas que pretendem atingir. Se as tarefas demasiado simples não constituem para elas um desafio, também o não constitui a escolha de tarefas muito difíceis. É que, no primeiro caso, fazer o que toda a gente é capaz de fazer não granjeia sucesso. No segundo, são poucas as hipóteses de êxito.
• Diferentemente, as pessoas dominadas pelo medo do fracasso preferem tarefas muito fáceis ou muito difíceis. As primeiras dão-lhes a garantia de não falhar; as segundas não lhes provocam ansiedade por não ser motivo de vergonha fracassar em tarefas que só poucas pessoas conseguem desempenhar.
As pessoas motivadas para o sucesso são, na sua grande maioria, pessoas empreendedoras, apresentando como características fundamentais:
• Gosto em assumir riscos.
• Confiança na capacidade de ser bem sucedido.
• Empenhamento em acções voltadas para o êxito pessoal.
• Desejo de liberdade e responsabilidade individual.
• Vontade de atingir padrões de excelência.
Pessoas com estas características são dotadas de espírito de iniciativa, constituindo-se como líderes carismáticos nos mais variados campos: política, economia, arte, educação, ciência e gestão empresarial.
Motivações combinadas
A fome e a sede foram incluídas na categoria das motivações fisiológicas, porque são reguladas por mecanismos biológicos inatos desencadeadores de impulsos homeostáticos. Estes resultam de carências fisiológicas e impulsionam o indivíduo para comportamentos que virão restabelecer o equilíbrio interno, necessário à sobrevivência do organismo.
O impulso sexual e o impulso maternal a nível da espécie humana são designados por motivações combinadas porque, tal como as fisiológicas, dependem de mecanismos biológicos inatos e, tal como as motivações aprendidas, dependem de outros factores, especialmente dos padrões culturais vigentes nas diversas comunidades.
A diferença entre motivações fisiológicas e motivações combinadas parece, à primeira vista, imperceptível ou mesmo inexistente. Todavia, muitos psicólogos explicitam algumas diferenças, entre as quais destacamos:
• Sexo e impulso maternal têm base biológica inata, mas não são impulsos homeostáticos. Não surgem como resultado de carências orgânicas perturbadoras do equilíbrio homeostático e susceptíveis de pôr em risco a sobrevivência.
De facto, se a fome ou a sede reclamam comportamentos tendentes a satisfazê-las, sob o risco da perda da sobrevivência, a não satisfação do impulso sexual não acarreta a morte do indivíduo.
• Sexo e impulso maternal são afectados pelos factores sociais num grau muito mais elevado que a fome e a sede.
Concluindo, as pessoas quase não diferem no modo como satisfazem a necessidade de oxigénio; já diferem muito na procura da comida; diferem ainda muito mais no modo como se relacionam sexualmente e como "amam" e cuidam dos filhos.
Motivação sexual
O impulso sexual gera também uma energia que leva o indivíduo a desenvolver comportamentos para satisfazer a necessidade, posto o que cessa o impulso. Nos animais, impulso, cortejamento e coito processam-se segundo mecanismos naturais, inatos, instintivos e de natureza essencialmente orgânica. No homem, os caracteres inatos e orgânicos manifestam-se essencialmente a nível do impulso, mas o cortejamento e o acto sexual obedecem a imperativos de natureza sociocultural.
Quer o hipotálamo, quer as hormonas produzidas pelas gónadas e hipófise interferem no controlo da actividade sexual.
Porém, no homem, mais importante que esta base fisiológica e inata, são os factores aprendidos no contexto cultural. É que o ser humano possui uma dimensão histórica, abarcando com o peso de uma tradição social, portadora de regras de conduta que se lhe impõem logo após o nascimento.
É assim que a resposta fisiológica, directa e instintiva, vai sendo substituída por outra menos natural, mas de acordo com normas ditadas pelo contexto social em que se desenvolve o indivíduo. Tais normas constituem um todo complexo de que evidenciamos, por exemplo, as crenças e os costumes, o direito e a moral.
Ora, como estes aspectos carecem de universalidade, o comportamento sexual manifesta-se das formas mais variadas e heterogéneas.
Na nossa sociedade, espera-se que o homem tome a iniciativa, convidando a mulher para sair, oferecendo-lhe presentes e pedindo-a em casamento. O mesmo não acontece com os Goajiros, Índios da América do Sul, em que é a mulher que, ao rasteirar o homem durante uma dança ritual, lhe demonstra, assim, o seu interesse.
Estas diferenças de conduta sexual bastam para mostrar como as motivações de origem biológica são modificadas e condicionadas por factores externos, de Índole sociocultural.
O próprio desencadeamento do impulso sexual depende de estímulos ambientais.
Nas espécies animais há certos sinais que atraem os parceiros ou indicam a sua receptividade sexual. Na altura própria, alguns animais emitem naturalmente odores característicos, outros alteram a cor da pele, outros ainda movimentam-se segundo um padrão típico da espécie.
Nos seres humanos, os sinais sexuais são totalmente aprendidos. Entre estes sinais incluem-se todos os aspectos relacionados com o que é fisicamente atraente e que são, como sabemos, especificamente culturais. Por exemplo, nos nossos dias a magreza é considerada "sexy", mas se recuarmos uns anos, sabemos bem que ninguém punha em causa a afirmação de que "gordura é formosura". Outros sinais sexuais comuns na nossa sociedade têm muito a ver com o uso de jóias, maquilhagem, perfumes, roupas, gestos, posturas corporais, olhares e outras expressões fisionómicas. Os filmes eróticos e pornográficos ou outras impigens sexuais surtem também efeitos no despertar do desejo sexual.
O comportamento sexual envolve ainda elementos psicológicos fundamentais, constituídos por diversas emoções e sentimentos. No relacionamento sexual dos jovens adultos, a atracção física e o desejo de prazer predominam mas, à medida que o relacionamento se desenvolve e amadurece, outros sentimentos vão desempenhando um papel cada vez mais importante. No relacionamento sexual posterior, a atracção sexual associa-se à afeição, ao amor, ao companheirismo, à estima, à protecção, sentimentos fundamentais para que tal relacionamento se torne estável e duradoiro.
Comportamento maternal
A preservação das espécies depende dos comportamentos maternal e sexual. Se o comportamento sexual conduz à reprodução, o maternal leva à prestação dos cuidados necessários para que os descendentes se tornem aptos a viver em autonomia.
Nos animais estas condutas têm origem instintiva, embora alguns mamíferos, como os macacos, necessitem de algumas aprendizagens.
Nos seres humanos, o comportamento maternal implica condutas diversas que visam os cuidados com a alimentação, a higiene, a protecção e a educação, e envolve ainda um conjunto de sentimentos como o carinho, ternura, atenção, afecto e dedicação. Uns e outros são aprendidos no contexto social, pelo que tratar dos filhos é algo que só é possível após uma aprendizagem que mãe e pai têm de efectuar.
No que respeita à nossa sociedade, o conceito de cuidados maternos tem vindo a sofrer alterações ao longo do tempo e como "ser mãe" implica uma decisão pensada em função de condicionalismos de natureza social.
É óbvio que o comportamento maternal conta com alguns factores de natureza biológica que ocorrem durante a gravidez e amamentação.
Com o prosseguimento da gravidez, o sistema hormonal começa a desempenhar funções importantes no comportamento maternal. Assim, a progesterona segregada pelos ovários provoca o desenvolvimento das glândulas mamárias. No final da gravidez, a hipófise, estimulada pela presença do feto no útero começa a produzir prolactina, que, por sua vez, vai estimular as glândulas mamárias relativamente à produção de leite para a alimentação do bebé.
Contudo, estas modificações fisiológicas não criam na mãe o desejo de amamentar o filho, nem desencadeiam qualquer outro comportamento tendente a cuidar dele. Tais comportamentos devem-se sobretudo a factores ligados à aprendizagem social, pelo que uma mulher que nunca tenha observado como se cuida de um recém-nascido, se vier a ter um filho não saberá tratar dele.
Até agora, ao falarmos de comportamento maternal referimo-nos sempre à mulher que carrega o filho no ventre durante nove meses e que dele cuida durante a infância. Contudo, as expressões "comportamento maternal", "amor materno" e "impulso maternal" têm hoje um sentido muito mais amplo.
• Se analisarmos o que se passa noutras sociedades, constataremos que o modo de tratar as crianças apresenta enormes variações, algumas das quais nos repugna considerá-las como "comportamento maternal".
Segundo Margaret Mead, entre os Mundugumores, as crianças são rispidamente tratadas desde o nascimento. Precisam de lutar para que as mães as deixem mamar ao peito e crescem sem afecto e entregues a si próprias.
• Os cuidados maternos podem ser partilhados ou mesmo integralmente assumidos pelo pai, quer por livre escolha ou por temperamento, quer por razões ligadas às profissões exercidas pelo casal, por morte da mãe ou por motivos de divórcio.
• Mulheres que nunca tiveram filhos podem exercer o papel de mãe tão bem ou até melhor do que as mães biológicas. As mães adoptivas são exemplo claro de que a prestação de cuidados e o amor que se dedica aos filhos não dependem de laços biológicos ou naturais, mas de laços psicológicos que se constroem nas interacções socio-afectivas mãe-bebé.
segunda-feira, 29 de março de 2010
*Processos de memória
A codificação refere-se ao modo como uma pessoa transforma a entrada de uma informação física e sensorial em uma espécie de representação que pode ser colocada na memória.
O armazenamento refere-se à maneira como a pessoa mantém a informação codificada na memória.
A recuperação refere-se ao modo como a pessoa obtém acesso à informação armazenada na memória.
Estes processos interagem reciprocamente e são interdependentes.
Por exemplo, ao tentar codificar a informação no texto apresentado, você pode ter achado complicado para codificar, dificultando também o armazenamento e a recuperação da informação. Entretanto um rótulo verbal pode facilitar a codificação e, por conseguinte, o armazenamento e a recuperação. A maioria das pessoas aceita melhor o trecho se lhes for dado seu título “Lavagem de roupas”.
ARMAZENAMENTO DA INFORMAÇÃO/TRANFÊRENCIA DA INFORMAÇÃO
Segundo a Teoria da Interferência, o esquecimento ocorre porque uma nova informação interfere na antiga e finalmente a desloca, na MCP;
Há pelo menos dois tipos de interferência que aparecem na teoria e na pesquisa psicológica: a interferência retroactiva (causada pela actividade que ocorre depois que a pessoa aprende alguma coisa, mas antes de ela ser solicitada a evocar essa coisa) e a interferência proactiva (quando o conteúdo interferente atua antes, não depois da aprendizagem do conteúdo a ser lembrado);
Segundo a Teoria da Deterioração, a informação é esquecida porque desaparece gradualmente, com o passar do tempo, e não porque ela foi deslocada por outra informação.
Consolidação: Um método para realizar a transferência da informação no qual deliberadamente presta-se atenção à informação a fim de compreendê-la. Faz-se isto integrando os novos dados aos esquemas já existentes da informação armazenada. Muito utilizado na transferência para a MLP.
Repetição: Método através do qual é feita uma recitação repetida de um item. A repetição pode ser aberta quando a recitação é em voz alta e óbvia a qualquer pessoa que estiver observando, ou oculta quando a recitação é silenciosa e escondida;
Herman Ebbinghauss (1885), apoiado mais tarde por Harry Bahrick e Elizabeth Phelps (1987) observaram que as pessoas tendem a lembrar-se da informação por mais tempo quando a adquirem pela prática distribuída (aprendizagem na qual várias sessões são espaçadas ao longo do tempo) do que na prática aglomerada (com sessões apinhadas, todas juntas). Quanto maior a distribuição das experiências de aprendizagem ao longo do tempo, mais elas as lembravam durante longos períodos de tempo;
Processos de Construção da Memória
Frederico Bartlett (1932) reconheceu a necessidade de estudar-se a recuperação da memória para textos associados e não apenas para séries não-relacionadas de dígitos;
Ele sugeriu que, nestes casos, as pessoas trazem para uma tarefa de memória seus esquemas já existentes que às vezes levam à interferência ou à distorção e, outras vezes, à intensificação dos processos de memória;
Experimentos também mostraram uma grande susceptibilidade das pessoas para a distorção em relatos de testemunho ocular, evidenciando que elas podem facilmente ser levadas a construir uma memória que é diferente do que realmente aconteceu;
Outros favores que interferem na eficácia da recuperação da memória são: (a) a existência de esquemas mais elaborados em especialistas quanto à sua área de actuação, (b) clareza percebida da experiência e seu contexto, (c) a intensidade emocional de uma experiência.
O armazenamento refere-se à maneira como a pessoa mantém a informação codificada na memória.
A recuperação refere-se ao modo como a pessoa obtém acesso à informação armazenada na memória.
Estes processos interagem reciprocamente e são interdependentes.
Por exemplo, ao tentar codificar a informação no texto apresentado, você pode ter achado complicado para codificar, dificultando também o armazenamento e a recuperação da informação. Entretanto um rótulo verbal pode facilitar a codificação e, por conseguinte, o armazenamento e a recuperação. A maioria das pessoas aceita melhor o trecho se lhes for dado seu título “Lavagem de roupas”.
ARMAZENAMENTO DA INFORMAÇÃO/TRANFÊRENCIA DA INFORMAÇÃO
Segundo a Teoria da Interferência, o esquecimento ocorre porque uma nova informação interfere na antiga e finalmente a desloca, na MCP;
Há pelo menos dois tipos de interferência que aparecem na teoria e na pesquisa psicológica: a interferência retroactiva (causada pela actividade que ocorre depois que a pessoa aprende alguma coisa, mas antes de ela ser solicitada a evocar essa coisa) e a interferência proactiva (quando o conteúdo interferente atua antes, não depois da aprendizagem do conteúdo a ser lembrado);
Segundo a Teoria da Deterioração, a informação é esquecida porque desaparece gradualmente, com o passar do tempo, e não porque ela foi deslocada por outra informação.
Consolidação: Um método para realizar a transferência da informação no qual deliberadamente presta-se atenção à informação a fim de compreendê-la. Faz-se isto integrando os novos dados aos esquemas já existentes da informação armazenada. Muito utilizado na transferência para a MLP.
Repetição: Método através do qual é feita uma recitação repetida de um item. A repetição pode ser aberta quando a recitação é em voz alta e óbvia a qualquer pessoa que estiver observando, ou oculta quando a recitação é silenciosa e escondida;
Herman Ebbinghauss (1885), apoiado mais tarde por Harry Bahrick e Elizabeth Phelps (1987) observaram que as pessoas tendem a lembrar-se da informação por mais tempo quando a adquirem pela prática distribuída (aprendizagem na qual várias sessões são espaçadas ao longo do tempo) do que na prática aglomerada (com sessões apinhadas, todas juntas). Quanto maior a distribuição das experiências de aprendizagem ao longo do tempo, mais elas as lembravam durante longos períodos de tempo;
Processos de Construção da Memória
Frederico Bartlett (1932) reconheceu a necessidade de estudar-se a recuperação da memória para textos associados e não apenas para séries não-relacionadas de dígitos;
Ele sugeriu que, nestes casos, as pessoas trazem para uma tarefa de memória seus esquemas já existentes que às vezes levam à interferência ou à distorção e, outras vezes, à intensificação dos processos de memória;
Experimentos também mostraram uma grande susceptibilidade das pessoas para a distorção em relatos de testemunho ocular, evidenciando que elas podem facilmente ser levadas a construir uma memória que é diferente do que realmente aconteceu;
Outros favores que interferem na eficácia da recuperação da memória são: (a) a existência de esquemas mais elaborados em especialistas quanto à sua área de actuação, (b) clareza percebida da experiência e seu contexto, (c) a intensidade emocional de uma experiência.
*Modelos de Memória
O Primeiro Modelo:
Em 1965, Nancy Waugh e Donald Norman propuseram um modelo distinguindo duas estruturas de memórias:
Memória primária: nela são mantidas as informações temporárias comumente em uso.
Memória secundária: nela são mantidas permanentemente as informações ou, no mínimo, por um longo período de tempo.
O Modelo Tradicional:
Em 1968, Richard Atkinson e Richard Shiffin apresentaram um metáfora alternativa que conceituava a memória em termos de três armazenamentos de memória: armazenamento sensorial, armazenamento de curto prazo e armazenamento de longo prazo.
Eles distinguiam as estruturas que denominavam armazenamentos , das informações armazenadas nas estruturas, às quais denominavam memória .
Actualmente os psicólogos cognitivos descrevem usualmente os três armazenamentos como memória sensorial (MS), memória de curto prazo(MCP) e memória de longo prazo (MLP).
O MODELO TRADICIONAL
Memória Sensorial (MS): Capaz de estocar quantidades relativamente limitadas de informação por períodos de tempo muito breves. Repositório inicial das muitas informações que, posteriormente ingressam na memória de curto prazo e na memória de longo prazo.
Memória de Curto Prazo (MCP): Capaz de armazenar informações por períodos de tempo um pouco mais longos, mas também de capacidade relativamente limitada.
Memória de Longo Prazo (MLP): Capaz de estocar informações durante períodos de tempo muito longos, talvez até indefinidamente.
Em 1965, Nancy Waugh e Donald Norman propuseram um modelo distinguindo duas estruturas de memórias:
Memória primária: nela são mantidas as informações temporárias comumente em uso.
Memória secundária: nela são mantidas permanentemente as informações ou, no mínimo, por um longo período de tempo.
O Modelo Tradicional:
Em 1968, Richard Atkinson e Richard Shiffin apresentaram um metáfora alternativa que conceituava a memória em termos de três armazenamentos de memória: armazenamento sensorial, armazenamento de curto prazo e armazenamento de longo prazo.
Eles distinguiam as estruturas que denominavam armazenamentos , das informações armazenadas nas estruturas, às quais denominavam memória .
Actualmente os psicólogos cognitivos descrevem usualmente os três armazenamentos como memória sensorial (MS), memória de curto prazo(MCP) e memória de longo prazo (MLP).
O MODELO TRADICIONAL
Memória Sensorial (MS): Capaz de estocar quantidades relativamente limitadas de informação por períodos de tempo muito breves. Repositório inicial das muitas informações que, posteriormente ingressam na memória de curto prazo e na memória de longo prazo.
Memória de Curto Prazo (MCP): Capaz de armazenar informações por períodos de tempo um pouco mais longos, mas também de capacidade relativamente limitada.
Memória de Longo Prazo (MLP): Capaz de estocar informações durante períodos de tempo muito longos, talvez até indefinidamente.
*Tipos de memória
O tempo que uma recordação perdura é muito variável, isto é, não retemos todas as informações que recebemos durante o mesmo tempo. Portanto, esta característica sugere uma classificação da memória quanto à duração. Perante isto temos dois tipos de memória, memória a curto prazo e memória a longo prazo.
Memória a curto prazo: é uma memória que retém a informação durante um período limitado de tempo, podendo ser esquecida ou passar para a memória a longo prazo (que explicaremos mais à frente). Neste tipo de memória, distinguem-se duas componentes: a memória imediata e a memória de trabalho. Passando a explicar cada uma das componentes, a primeira diz respeito ao material recebido que fica retido durante uma fracção de tempo – cerca de 30 segundos. Por outro lado, a memória de trabalho mantém a informação enquanto ela nos é útil, por exemplo, um número de telefone que não tivemos oportunidade de registar por escrito. Sendo assim “A memória de trabalho reporta-se às actividades mentais que não têm por objectivo a memorização de informações, mas que, apesar disso, implicam uma certa memorização para se poderem aplicar de modo eficaz.”
Memória a longo prazo: é um tipo de memória que é alimentada pelos materiais da memória a curto prazo que são codificados em símbolos, esta mantém os materiais durante horas, meses ou toda a vida. Distinguem-se, geralmente, dois tipos de memória a longo prazo que dependem de estruturas cerebrais diferentes: memória declarativa e memória não declarativa. Enquanto que a última, é uma memória automática que mantém as informações subjacentes à questão “Como?”, por exemplo: como andar de bicicleta, como lavar os dentes, como pentear o cabelo, etc.Quando desenvolvemos estes comportamentos, não temos consciência de que são capacidades que dependem da memória. A memória declarativa, por seu lado, implica a consciência do passado, do tempo, reportando-se a acontecimentos, factos, pessoas. Distinguem-se, neste tipo de memória, geralmente, dois subsistemas: a memória episódica que envolve recordações, como os rostos de familiares, amigos e ídolos, músicas preferida, etc. Portanto, esta memória é pessoal que manifesta uma relação íntima entre quem recorda e o que se recorda. A outra é a memória semântica que se refere ao conhecimento geral sobre o mundo (leis da química, factos históricos, etc.), neste tipo de memória, não há localização no tempo, não estando ligado a nenhum conhecimento ou acção específicos, nem referenciado a nenhum facto específico do passado.
Ligação da memória a outros processos cognitivos:
A aprendizagem está intimamente ligada à memória, pois aquilo que aprendemos tem de ser conservado. “Não podemos aprender sem recordar, nem recordar sem aprender.” Os conhecimentos e as vivências anteriores, que eu recordo, permitem-me seleccionar, organizar e reconhecer as informações do presente.
A aprendizagem define-se como uma mudança relativamente estável e duradoura do comportamento e do conhecimento, que está relacionada com a experiência, com a descoberta... É através das experiências que aprendemos novas atitudes, novas competências, novos medos, novos conceitos, novas formas de resolver os problemas. Pela aprendizagem adquirimos saberes e desenvolvemos capacidades, ocorrendo uma mudança pessoal.
O processo de aprendizagem pressupõe comportamentos perceptivos, motores, intelectuais, emocionais e sociais. Inerente a este processo está a memória, pois só ela nos permite reter o que aprendemos para resolver situações presentes e projectar o futuro.
O termo memória provém do grego, de mnémon, que significa ‘que se recorda’. Aristóteles refere-se à memória como a faculdade de conservar o passado. A este propósito, George Gusdorf afirma que “a memória constitui uma espécie de retrato do que somos, composto com os traços do que fomos”. De facto, é a memória que nos dá o sentimento de identidade pessoal: as experiências vividas e acumuladas constituem o nosso património pessoal que nos distingue de todos os outros e nos torna únicos.
Memória a curto prazo: é uma memória que retém a informação durante um período limitado de tempo, podendo ser esquecida ou passar para a memória a longo prazo (que explicaremos mais à frente). Neste tipo de memória, distinguem-se duas componentes: a memória imediata e a memória de trabalho. Passando a explicar cada uma das componentes, a primeira diz respeito ao material recebido que fica retido durante uma fracção de tempo – cerca de 30 segundos. Por outro lado, a memória de trabalho mantém a informação enquanto ela nos é útil, por exemplo, um número de telefone que não tivemos oportunidade de registar por escrito. Sendo assim “A memória de trabalho reporta-se às actividades mentais que não têm por objectivo a memorização de informações, mas que, apesar disso, implicam uma certa memorização para se poderem aplicar de modo eficaz.”
Memória a longo prazo: é um tipo de memória que é alimentada pelos materiais da memória a curto prazo que são codificados em símbolos, esta mantém os materiais durante horas, meses ou toda a vida. Distinguem-se, geralmente, dois tipos de memória a longo prazo que dependem de estruturas cerebrais diferentes: memória declarativa e memória não declarativa. Enquanto que a última, é uma memória automática que mantém as informações subjacentes à questão “Como?”, por exemplo: como andar de bicicleta, como lavar os dentes, como pentear o cabelo, etc.Quando desenvolvemos estes comportamentos, não temos consciência de que são capacidades que dependem da memória. A memória declarativa, por seu lado, implica a consciência do passado, do tempo, reportando-se a acontecimentos, factos, pessoas. Distinguem-se, neste tipo de memória, geralmente, dois subsistemas: a memória episódica que envolve recordações, como os rostos de familiares, amigos e ídolos, músicas preferida, etc. Portanto, esta memória é pessoal que manifesta uma relação íntima entre quem recorda e o que se recorda. A outra é a memória semântica que se refere ao conhecimento geral sobre o mundo (leis da química, factos históricos, etc.), neste tipo de memória, não há localização no tempo, não estando ligado a nenhum conhecimento ou acção específicos, nem referenciado a nenhum facto específico do passado.
Ligação da memória a outros processos cognitivos:
A aprendizagem está intimamente ligada à memória, pois aquilo que aprendemos tem de ser conservado. “Não podemos aprender sem recordar, nem recordar sem aprender.” Os conhecimentos e as vivências anteriores, que eu recordo, permitem-me seleccionar, organizar e reconhecer as informações do presente.
A aprendizagem define-se como uma mudança relativamente estável e duradoura do comportamento e do conhecimento, que está relacionada com a experiência, com a descoberta... É através das experiências que aprendemos novas atitudes, novas competências, novos medos, novos conceitos, novas formas de resolver os problemas. Pela aprendizagem adquirimos saberes e desenvolvemos capacidades, ocorrendo uma mudança pessoal.
O processo de aprendizagem pressupõe comportamentos perceptivos, motores, intelectuais, emocionais e sociais. Inerente a este processo está a memória, pois só ela nos permite reter o que aprendemos para resolver situações presentes e projectar o futuro.
O termo memória provém do grego, de mnémon, que significa ‘que se recorda’. Aristóteles refere-se à memória como a faculdade de conservar o passado. A este propósito, George Gusdorf afirma que “a memória constitui uma espécie de retrato do que somos, composto com os traços do que fomos”. De facto, é a memória que nos dá o sentimento de identidade pessoal: as experiências vividas e acumuladas constituem o nosso património pessoal que nos distingue de todos os outros e nos torna únicos.
*POR QUE NÃO MANTEMOS SEMPRE O MESMO RITMO DE APRENDIZAGEM?
Quando estamos a aprender a andar de bicicleta, costumamos ter melhorias significativas na fase inicial da aprendizagem e, nos dias seguintes, avanços mais modestos. O mesmo acontece com a condução automóvel: há ganhos formidáveis na forma como conduzimos um carro nas primeiras semanas, mas nos anos subsequentes não evoluímos nesse ritmo. Por que razão isto acontece? Um grupo de investigadores do Laboratório de Neurobiologia da Universidade de Duke - do qual faz parte o cientista português Rui Costa -, nos Estados Unidos, publicou há pouco tempo um estudo que aponta uma explicação para este mistério: os neurónios que "ganham" diferentes funções durante as duas fases de aprendizagem motora são, na realidade, regidos por processos neuronais distintos.
Um dos dotes especiais do nosso sistema nervoso é sua capacidade de gerir estrategicamente os recursos. É por isso, por exemplo, que os cegos congénitos costumam ouvir excepcionalmente bem: o cérebro reorganiza-se e canaliza determinadas conexões, que de outra forma seriam perdidas, para o processamento de sons. O exército de neurónios torna-se, assim, muito polivalente. As estruturas neuronais podem estabelecer diferentes conexões entre si. Se houver a baixa de um soldado, por exemplo, um outro militar pode aprender a função que o colega exercia antes. Ou então estabelecer novas alianças.
Esta comparação pode não ser muito rigorosa em termos científicos, mas ajuda a compreender a chamada plasticidade neuronais. É que, perante situações que envolvem a aprendizagem e a memória, o nosso cérebro opera mudanças nas redes neuronais. Por outras palavras, reorganiza as células nervosas em função dos processos desenvolvidos pelos circuitos cerebrais. Indivíduos que tocam piano ou que, uma vez cegos, começam a ler em Braille, por exemplo, passam a ter uma maior representação do córtex motor na ponta dos dedos.
Estas mudanças que ocorrem nos neurónios são, de alguma forma, um mecanismo que pode permitir a adaptação ao ambiente e a recuperação de lesões nervosas. Quando dizemos que os nossos neurónios não se reproduzem, muitas vezes não nos lembramos que, apesar da maior partes destas células do tecido nervoso não terem a propriedade de se multiplicar, elas são capazes de assumir novas funções e participar em diferentes circuitos.
A plasticidade neuronal que ocorre durante a prática de uma actividade motora - como escrever no computador ou tocar um instrumento musical - não se limita a um fenómeno único e linear. Esta investigação liderada pelo brasileiro Miguel Nicolelis, o responsável pelo Laboratório de Neurobiologia da Universidade de Duke, revela que a aprendizagem motora pressupõe uma fase rápida seguida de outra lenta e que, em cada uma destas etapas, decorrem plasticidades neuronais distintas.
Os cientistas registaram a actividade neuronal em zonas específicas dos cérebros dos ratinhos. Foram monitorizadas, mais exactamente, duas estruturas que funcionam em circuito: o córtex motor e os gânglios basais dorsais. Ao longo de três dias, os roedores foram observados enquanto faziam um determinado exercício físico (ver caixa). O trabalho evidenciou a existência de certos circuitos do cérebro que, durante as fases rápida e lenta da aprendizagem motora, sofrem modulações na sua actividade e conectividade neuronal. "Os gânglios basais dorsais estão envolvidos precisamente na aprendizagem de hábitos e tarefas motoras, bem como na noção de tempo. O córtex motor recebe indirectamente a informação vinda dos gânglios e participa na aprendizagem motora e na execução dos movimentos, mas também envia mensagens de volta para os gânglios, proporcionando assim um 'feedback' sobre o que está a acontecer. Eles trabalham como um circuito durante todas as fases de aprendizagem motora, mas há alturas em que os processo de plasticidade são similares em ambos e, por outro lado, há alturas em que cada estrutura aperfeiçoa diferentes partes do movimento", explica Rui Costa, autor deste trabalho, publicado na revista "Current Biology", em conjunto com Nicolelis e Dana Cohen.
Em relação à aprendizagem motora, estudos anteriores já haviam revelado mudanças na actividade e na conectividade neuronal em várias áreas do cérebro - o córtex motor e os gânglios basais dorsais, por exemplo. Só que ainda estava por explicar a natureza e a dinâmica desta plasticidade neuronal durante a aprendizagem motora. A equipa da Universidade de Duke verificou nesta experiência que, de facto, são díspares os fenómenos de plasticidade registados na fase rápida e lenta de aprendizagem motora.
Público - 27/07/2004 - POR ANDRÉIA AZEVEDO SOARES
Um dos dotes especiais do nosso sistema nervoso é sua capacidade de gerir estrategicamente os recursos. É por isso, por exemplo, que os cegos congénitos costumam ouvir excepcionalmente bem: o cérebro reorganiza-se e canaliza determinadas conexões, que de outra forma seriam perdidas, para o processamento de sons. O exército de neurónios torna-se, assim, muito polivalente. As estruturas neuronais podem estabelecer diferentes conexões entre si. Se houver a baixa de um soldado, por exemplo, um outro militar pode aprender a função que o colega exercia antes. Ou então estabelecer novas alianças.
Esta comparação pode não ser muito rigorosa em termos científicos, mas ajuda a compreender a chamada plasticidade neuronais. É que, perante situações que envolvem a aprendizagem e a memória, o nosso cérebro opera mudanças nas redes neuronais. Por outras palavras, reorganiza as células nervosas em função dos processos desenvolvidos pelos circuitos cerebrais. Indivíduos que tocam piano ou que, uma vez cegos, começam a ler em Braille, por exemplo, passam a ter uma maior representação do córtex motor na ponta dos dedos.
Estas mudanças que ocorrem nos neurónios são, de alguma forma, um mecanismo que pode permitir a adaptação ao ambiente e a recuperação de lesões nervosas. Quando dizemos que os nossos neurónios não se reproduzem, muitas vezes não nos lembramos que, apesar da maior partes destas células do tecido nervoso não terem a propriedade de se multiplicar, elas são capazes de assumir novas funções e participar em diferentes circuitos.
A plasticidade neuronal que ocorre durante a prática de uma actividade motora - como escrever no computador ou tocar um instrumento musical - não se limita a um fenómeno único e linear. Esta investigação liderada pelo brasileiro Miguel Nicolelis, o responsável pelo Laboratório de Neurobiologia da Universidade de Duke, revela que a aprendizagem motora pressupõe uma fase rápida seguida de outra lenta e que, em cada uma destas etapas, decorrem plasticidades neuronais distintas.
Os cientistas registaram a actividade neuronal em zonas específicas dos cérebros dos ratinhos. Foram monitorizadas, mais exactamente, duas estruturas que funcionam em circuito: o córtex motor e os gânglios basais dorsais. Ao longo de três dias, os roedores foram observados enquanto faziam um determinado exercício físico (ver caixa). O trabalho evidenciou a existência de certos circuitos do cérebro que, durante as fases rápida e lenta da aprendizagem motora, sofrem modulações na sua actividade e conectividade neuronal. "Os gânglios basais dorsais estão envolvidos precisamente na aprendizagem de hábitos e tarefas motoras, bem como na noção de tempo. O córtex motor recebe indirectamente a informação vinda dos gânglios e participa na aprendizagem motora e na execução dos movimentos, mas também envia mensagens de volta para os gânglios, proporcionando assim um 'feedback' sobre o que está a acontecer. Eles trabalham como um circuito durante todas as fases de aprendizagem motora, mas há alturas em que os processo de plasticidade são similares em ambos e, por outro lado, há alturas em que cada estrutura aperfeiçoa diferentes partes do movimento", explica Rui Costa, autor deste trabalho, publicado na revista "Current Biology", em conjunto com Nicolelis e Dana Cohen.
Em relação à aprendizagem motora, estudos anteriores já haviam revelado mudanças na actividade e na conectividade neuronal em várias áreas do cérebro - o córtex motor e os gânglios basais dorsais, por exemplo. Só que ainda estava por explicar a natureza e a dinâmica desta plasticidade neuronal durante a aprendizagem motora. A equipa da Universidade de Duke verificou nesta experiência que, de facto, são díspares os fenómenos de plasticidade registados na fase rápida e lenta de aprendizagem motora.
Público - 27/07/2004 - POR ANDRÉIA AZEVEDO SOARES
*Tipos ou sistemas de memória
Ainda não sabemos exactamente quantos sistemas de memória existem e como devem ser designados. No entanto, algumas ideias gerais parecem estar assentes. Sabemos que a memória depende de alterações nos neurónios e nas suas ligações. Sabemos, também, que os sistemas de memória já identificados dependem de estruturas específicas do cérebro, de mecanismos próprios de codificação, de estratégias e de regras internas.
Um número de telefone pode apagar-se facilmente da nossa mente, mas uma recordação da infância pode manter-se para sempre. Assim se manifestam dois grandes tipos de memória, a breve, designada por memória de curto prazo, e a duradoura, designada por memória de longo prazo.
A memória de curto prazo envolve os processos que retêm a informação temporariamente até ser esquecida ou guardada num armazém de longo prazo tornando-se potencialmente permanente.
Apresenta duas componentes, a memória imediata e a de trabalho. A memória imediata retém a informação quando é recebida, tornando-se o centro da nossa atenção em determinado momento. Ocupa o pensamento durante mais ou menos 30 segundos e tem capacidade para mais ou menos sete ou oito itens. Mas este tempo pode alargar-se se o conteúdo for repetido. Lembremo-nos de quando éramos pequenos e a nossa mãe nos pedia que fôssemos comprar alguma coisa. Íamos pela rua fora a repetir mentalmente ou a cantarolar «cinco pães, um pacote de leite, um quilo de limões e o jornal». Esta é a memória de trabalho.
A memória de trabalho é uma espécie de lista de compras que é esquecida mal acabamos de a utilizar. Da mesma forma, um número de telefone é passível de ser mantido na memória durante um pequeno período de tempo, utilizando a mesma estratégia. E para isso até o decompomos em conjunto de dois ou três elementos. Em vez de repetirmos tudo de seguida 214295637, utilizamos três grupos de algarismos 214 295 637. Agora imagine-se alguém que tinha no seu atendedor de chamadas a seguinte mensagem: «Acabou de ligar para o duzentos e vinte e oito milhões, cento e cinquenta e três mil, novecentos e quarenta e dois. Deixe a sua mensagem após o sinal ou, no caso de ter urgência, ligue para o novecentos e trinta e três milhões, setecentos e vinte e um mil, e sessenta». Seria extremamente difícil não só compreender o número como retê-lo.
A memória imediata e de trabalho operam em paralelo e são os dois componentes principais da memória de curto prazo. Mas existem outros que se manifestam posteriormente até ao estabelecimento de uma memória estável. Permitem manter a informação de minutos a uma hora ou mesmo mais, bem para além do momento em que ela está a ser activamente retida. Por exemplo, "amanhã não me posso esquecer de levar o livro para emprestar à Ana". Após a tarefa cumprida, no dia seguinte, a memória desaparece.
A memória de longo prazo envolve os processos que retêm recordações como episódios da nossa vida, rostos de pessoas conhecidas ou conceitos.
Tanto a memória de curto prazo como a de longo prazo provocam alterações na estrutura e nas ligações das células nervosas. As mesmas ligações entre neurónios podem participar nos dois tipos de armazenamento. Existe um mecanismo semelhante a um "transformador molecular" que converte a memória de curto prazo em memória de longo prazo.
Na memória de longo prazo podemos identificar dois subsistemas diferentes, a memória declarativa e a memória não declarativa. Elas dependem de sistemas cerebrais diferentes.
A memória não declarativa, também chamada implícita ou "sem registo», é uma memória automática e reflexa, que guarda as Informações de "saber como fazer as coisas". As experiências são convertidas em processos que alteram a natureza do organismo e as suas competências.
Não é uma recordação, mas uma alteração de comportamento, tal como esquiar, ler um mapa ou andar de bicicleta. É inconsciente embora possa ser acompanhada de algumas recordações, «espera lá, como é que costumo fazer isto?». Podemos aprender a fazer qualquer coisa e a seguir lembrarmo-nos de alguns elementos da mesma como, por exemplo, imaginarmo-nos a executá-Ia. No entanto, a capacidade de desempenhar a competência parece ser independente de recordações conscientes.
A memória não declarativa envolve processos de aprendizagem simples e reflexos como hábitos e condicionamentos. Por exemplo, quando aprendemos a andar de bicicleta é provável prestarmos muita atenção às manobras da roda da frente, à posição do guiador e ao acto de pedalar, primeiro com o pé esquerdo e depois com o direito. Mas quando adquirimos prática, o acto de andar de bicicleta é guardado como memória não declarativa, conduzimos e pedalamos automaticamente. Não é necessário evocar conscientemente que é preciso pressionar os pedais com o pé direito e depois com o esquerdo. Estas memórias mantêm-se intactas durante anos ou décadas.
A memória não declarativa permite-nos conservar procedimentos para actuarmos no mundo. À medida que vamos crescendo, aprendemos a dizer «por favor» e «obrigado», a lavar os dentes antes de irmos para a cama e a executar uma série de outros comportamentos que resultam da prática. Adquirimos muitos desses hábitos nos primeiros anos de vida sem qualquer esforço óbvio e quase sem repararmos que a aprendizagem está a decorrer. Por exemplo, quando aprendemos a ler, passamos com hesitação de palavra para palavra mas, depois de alguma prática, conseguimos ler rapidamente, movimentando os olhos para um ponto diferente quatro vezes por segundo, compreendendo mais de trezentas palavras por minuto.
A memória declarativa, também chamada explícita ou «com registo», é uma memória consciente do passado, um conjunto de Informações sobre pessoas, lugares, situações, acontecimentos ou factos, que guarda informações do «saber que». É a ela que habitualmente nos referimos quando usamos o termo «memória». É uma memória consciente do nome da nossa avó, do primeiro rei de Portugal, dos planetas do sistema solar, da conversa desta manhã.
Lembremo-nos do nome de um dos nossos amigos. Lembremo-nos do rosto dessa pessoa, do som da sua voz e da maneira de falar. Depois, lembremo-nos de um acontecimento particular em que tenha participado, uma conversa importante, uma viagem ou uma festa especial. Estamos a recriar o episódio, na nossa imaginação, deslocando-nos para o contexto, espacial e temporal, em que aconteceu. Parece surpreendente a facilidade com que evocamos a cena e o que se passou. Curiosamente, ao realizarmos um exercício deste tipo não precisamos de treino nem de instruções. Recordar de forma vivida o passado é algo que todos fazemos diariamente, sem grande esforço. A memória declarativa é a memória de todos os conhecimentos que podem ser «declarados» sob a forma de proposições verbais ou de imagens mentais. Ela é imperfeita, passível de inexactidões e de distorções, mas também pode ser fiel, especialmente quando guarda conhecimentos gerais sobre o mundo. Podemos confundir o nome de uma pessoa ou uma data de aniversário, mas não confundimos um elefante com uma baleia.
Muitas actividades requerem os três tipos de memória. Vejamos o jogo do ténis. Conhecer as regras ou quantos sets são precisos para ganhar uma partida envolve a memória semântica. Lembrar o lado que foi o último a servir, requer a memória episódica. Saber lançar a bola ou fazer um serviço envolve a memória não declarativa.
Processos básicos de memória (Momentos essenciais)
• Recepção e codificação da informação
• Armazenamento da informação
• Recuperação da informação
• Esquecimento da informação
O matemático John Griffith estimou que, num tempo médio de vida, uma pessoa armazena o equivalente a quinhentas vezes mais informação do que aquela que se pode encontrar em todos os volumes da Enciclopédia Britânica. John von Newmann, um dos pais dos computadores, calculou que, em média, as recordações memorizadas durante toda a vida humana deveriam atingir 2,8 x 1020 unidades elementares de informação. Correspondentes a vinte e oito milhares de milhão de bits e cerca de trezentos milhões de gigabites. Haverá espaço no nosso cérebro para este incrível volume de recordações? Em termos teóricos, o nosso cérebro não está mal equipado, cem mil milhões de neurónios, cada um dos quais com centenas ou milhares de possíveis contactos nervosos com outros neurónios, constitui uma rede nervosa de notável potência. A capacidade da memória humana depende de operações muito complexas.
A primeira operação de tratamento da informação é a recepção e codificação. À medida que chega, a informação sensorial é codificada de forma a poder ser comunicada ao cérebro.
Podem ser utilizados vários códigos. Por exemplo, pensemos na frase "Hoje está sol". Se codificarmos o som das palavras, tal como foram ditas, estamos a usar um código acústico e a informação é representada na memória como uma sequência de sons. Se codificarmos a imagem das letras, tal como estão organizadas em signos, estamos a usar um código visual e a informação é representada na memória como uma imagem. Finalmente, se codificarmos o facto "estar sol", estamos a usar um código semântico, e a informação é representada na nossa memória pelo seu significado. O tipo de código usado pode influenciar o que é lembrado.
Quando a codificação envolve bastante trabalho, ou seja, quando a informação é processada a um nível profundo, lembramo-nos dela mais facilmente.
Quando estamos a estudar um assunto, quanto mais gostarmos dele, quanto mais necessidade, desejo ou curiosidade tivermos, quanto mais nos implicarmos nessa tarefa, melhor será a sua aprendizagem. Mesmo quando a memória de qualquer facto pareceu não exigir esforço, o processo não é assim automático. Determinadas situações ou factos são recordados porque nos interessam realmente, mesmo sem termos consciência disso. Lembramo-nos porque desencadeamos espontaneamente operações de codificação profundas e elaboradas. Se não estivermos a fazer um esforço deliberado, são os nossos interesses e preferências que direccionam a atenção e influenciam a quantidade e a qualidade da codificação.
O segundo processo é o armazenamento. Trata-se da manutenção da informação ao longo do tempo, muitas vezes durante muito tempo.
Recordar umas férias da infância depende da capacidade de armazenamento da nossa memória. De que forma é que a informação codificada se mantém na memória? Não existe um sítio específico no cérebro onde se arrumam as recordações. No entanto, a informação não está espalhada por todo o lado. Ainda não é possível localizar os pontos onde a representação de um determinado objecto está armazenada. Mas as novas técnicas de recolha de imagens cerebrais têm mostrado que várias regiões cerebrais estão envolvidas no registo de um único acontecimento, e que cada região contribui de forma diferente para o todo. As alterações no cérebro, resultado da codificação e do registo da experiência, produzem traços mnésicos também chamados engramas.
A informação nova vai modificar um conjunto complexo de processos bioquímicos e cada informação, engrama, é representada por uma configuração particular da actividade nervosa. Num primeiro momento, o engrama é dinâmico e produzem-se mudanças nas ligações neuronais. Depois, torna-se estrutural, permanente, e capaz de reproduzir a actividade nervosa necessária à actualização da informação. Por isso, a memória não se estabelece num momento. Pelo contrário, leva um tempo considerável a desenvolver a sua forma permanente. O processo de fixação requer várias etapas e até estar completo, a memória mantém-se vulnerável a perturbações. Grande parte deste processo completa-se durante as primeiras horas de aprendizagem. Mas a estabilização estende-se muito para além deste ponto e envolve alterações contínuas na organização da memória de longo prazo.
O terceiro processo é a recuperação. Ocorre quando localizamos a informação na memória e a trazemos à consciência.
Recuperar informações armazenadas, como um endereço ou um número de telefone, é normalmente tão rápido e fácil que parece automático. Só quando tentamos recordar outros tipos de informação, tal como a resposta a uma pergunta que conhecemos mas que não conseguimos evocar, tomamos consciência do processo de busca. O processo de recuperação inclui a evocação e o reconhecimento. Quando não somos capazes de nos lembrar do nome de alguém, mas sabemos que conhecemos aquela cara, está em jogo este processo. Analisamos o estímulo, a cara, e procuramos na memória o nome que lhe está associado. Primeiro temos que saber se conhecemos a cara ou não, reconhecimento, e depois procuramos o tal nome, evocação. Quando estamos a responder a itens de escolha múltipla, estamos perante informação que identificamos e comparamos com a que temos guardada. É uma tarefa de reconhecimento.
A recuperação é ajudada por pistas, as alternativas. Quando estamos a responder a itens de resposta aberta, temos que procurar a informação necessária, a partir de estímulos gerais. É uma tarefa de evocação. Temos de recuperar a informação sem muita ajuda. O reconhecimento tende a ser mais fácil do que a evocação.
E como a nossa memória não é um gravador de som nem de imagem, os erros podem introduzir-se em qualquer momento, durante a codificação, o armazenamento ou a recuperação. Não sabemos ainda se o cérebro tem limites para armazenar informação. Mas sabemos que algumas situações, como a fadiga ou o aborrecimento, podem dificultar todo este processo. A última operação que falta neste esquema é o esquecimento e dele nos ocuparemos a seguir.
Memória e esquecimento
Esquecimento
Florbela Espanca
Esse de quem eu era e era meu,
Que foi um sonho e foi realidade,
Que me vestiu a alma de saudade,
Para sempre de mim desapareceu.
Tudo em redor então escureceu,
E foi longínqua toda a claridade!
Ceguei... tacteio sombras... que ansiedade!
Apalpo cinzas porque tudo ardeu!
Descem em mim poentes de Novembro...
A sombra dos meus olhos, a escurecer...
Veste de roxo e negro os crisântemos...
E desse que era eu meu já me não lembro...
Ah! a doce agonia de esquecer
A lembrar doidamente o que esquecemos...!
Texto extraído do livro "Sonetos", Bertrand Brasil - Rio de Janeiro, 2002, pág. 181.
O esquecimento é uma condição da memória
Os mais velhos têm frequentemente a sensação de que a sua memória está a abarrotar de recordações e que às vezes é difícil lembrarem-se daquilo que é útil e deixar de lado aquilo que, pelo contrário, parece "inútil". Mas independentemente da idade, a maior parte das pessoas considera que a sua memória não funciona tal como gostariam.
O esquecimento é normalmente sentido como uma espécie de "patologia" da memória. Porém, todas as pessoas, dia após dia, sabem o seu nome, fazem o jantar, lêem, entram no seu carro e conduzem no meio do trânsito travando, acelerando, accionando as mudanças, sem acusarem qualquer problema de memória.
O esquecimento é a incapacidade, provisória ou definitiva, de aceder conscientemente a uma informação adquirida ou a uma experiência vivida no passado mais imediato ou mais longínquo.
No dia seguinte a vermos um filme conseguimos contar o argumento e a acção de forma detalhada. No entanto, um ano mais tarde, não nos lembramos senão de um esboço do filme e talvez de fragmentos de algumas cenas.
À primeira vista, o esquecimento parece ser uma desvantagem. Não seria melhor recordar tudo o que lemos, nunca nos esquecermos de onde deixámos as chaves ou os óculos, guardarmos todas as situações que consideramos importantes? Esta questão não tem ainda uma resposta clara, mas parece que, sem esquecimento, a nossa capacidade de adaptação estaria seriamente ameaçada. O esquecimento é consequência do funcionamento da memória e, longe de ser uma limitação, é uma necessidade. Os sistemas cognitivos artificiais não esquecem nada, o que significa que não são capazes de modificar significativamente a informação em função da sua experiência do mundo. Podemos compreender este facto se analisarmos o que se passa com pessoas que não conseguem esquecer.
Uma pergunta que parece importante é «Esquecemos realmente a informação, ela desaparece do nosso cérebro, ou perdemos a capacidade de nos lembrar dela?»
O esquecimento repressivo (motivação inconsciente)
As amnésias psicopatológicas foram identificadas no fim do século XIX, tendo sido Freud um dos investigadores que se interessaram por este assunto. Elas manifestam--se como um esquecimento defensivo. A pessoa evita a recordação consciente de um acontecimento doloroso do passado, exercendo, inconscientemente, uma repressão sobre memórias penosas. Freud considerava que situações, por exemplo da infância,
que nos tenham perturbado e produzido angústia podem ser «recalcadas», guardadas de forma a dificilmente termos acesso a elas. O esquecimento destas situações seria psicologicamente motivado. Existe um mecanismo de defesa, o recalcamento, que nos protege de recordar factos que podem ser emocionalmente muito perturbadores. Estas memórias seriam guardadas no inconsciente por serem demasiado ameaçadoras se lembradas.
O esquecimento provocado
Este tipo de esquecimento pode ser consequência da ingestão de medicação, de drogas ou de álcool. Uma das personagens de Shakespeare, Lady Macbeth, que precisa de agir em segredo, decide recorrer às bem conhecidas propriedades do álcool, e afirma: «De tal forma hei-de embrutecer os camareiros no vinho, que neles, a memória guardiã do cérebro, será fumo, e a sede da razão, um simples alambique». O álcool, como é sabido, não reduz apenas o tempo de reacção, o sentido crítico, a ansiedade, mas age também sobre a memória. E Shakespeare que, ao que parece, se embriagava frequentemente, observa que o vinho pode alterar a memória por um breve período de tempo. Uma ingestão continuada de álcool em grandes quantidades tem consequências bem conhecidas de perda de concentração, problemas de equilíbrio e deficiente sentido de coordenação. Começa por destruir células do fígado e de partes do cérebro e pode conduzir a uma forma de amnésia grave e irreversível, conhecida como Síndrome de Korsakoff, devida à falta de tiamina, uma vitamina do complexo B, que no alcoólico não é suficientemente absorvida.
Depressão
Alzheimer
Intoxicações
AVC
O efeito de drogas que criam dependência é complexo e, em geral, prejudicial para a memória. Existem fármacos que penetram nas células do cérebro para tratar várias doenças como a epilepsia, a doença de Parkinson ou estados depressivos. Tomados nas doses recomendadas, não afectam a memória de modo grave. A excepção são os chamados «tranquilizantes», que podem provocar esquecimento ou mesmo amnésia quando tomados sem vigilância médica ou em doses excessivas. Toda a medicação eficaz tem inevitavelmente efeitos colaterais. As vantagens têm de ser confrontadas com os riscos e isso só o médico pode avaliar.
O esquecimento provocado também pode ser consequência de doenças e lesões cerebrais. Traumatismos, doenças do foro neurológico, acidentes vasculares cerebrais, tumores ou intervenções cirúrgicas, podem produzir lesões directas no suporte material da memória, quer dizer, no cérebro. Por exemplo, a doença de Alzheimer é uma degradação mental progressiva, que ocorre normalmente em pessoas de idade avançada. Os primeiros sintomas são distúrbios da memória que se tornam progressivamente mais graves até à incapacidade de se reconhecer a si próprio. Nestes doentes, a memória autobiográfica parece ser a mais afectada. Os estados de stress e de depressão, ou os choques emocionais fortes também podem causar amnésias.
O esquecimento regressivo
Com a idade, muitas pessoas podem manifestar dificuldades de memória quer ao nível de aprendizagens novas, que na evocação de nomes de pessoas conhecidas ou de acontecimentos recentes. Estas perturbações são muito diferentes das referidas anteriormente, mesmo se resultarem da degenerescência progressiva dos tecidos celulares cerebrais devida à idade. No entanto, com o aumento da esperança de vida, os progressos da medicina, a vontade das pessoas mais velhas de continuarem a trabalhar e a assumir responsabilidades sociais, os efeitos negativos da senescência são diminuídos. As investigações mostram que a capacidade da memória imediata muda relativamente pouco com a idade, mas as tarefas de atenção partilhada ou a memória de trabalho são mais afectadas. É importante salientar que isto depende da ocupação da pessoa e das capacidades cognitivas que continua ou não a exercer.
O esquecimento vulgar (interferência de novas aprendizagens)
• Inibição proactiva – Deterioração dos conteúdos mnésicos provocada pela interferência de recordações passadas.
• Inibição rectroactiva – Deterioração dos conteúdos mnésicos provocada pela interferência de novas informações.
Pode acontecer que a memória esteja lá e nós não a consigamos evocar por falta de pistas. Mas também pode acontecer que os traços mnésicos não passem para a memória de longo prazo pela capacidade limitada desta memória ou porque não foram transferidos. O carácter sucessivo de actividades mais ou menos similares efectuadas pela pessoa pode ser responsável pelo esquecimento. Mas, hoje em dia, aquilo que a investigação demonstra como sendo mais provável é que, como as experiências novas implicam sempre a reorganização das representações da memória, ou seja, dos circuitos da informação nas redes de neurónios, os nossos registos da experiência vão-se alterando, enfraquecendo e modificando, produzindo-se neste processo o esquecimento. As memórias não declarativas tendem a ser mais estáveis do que as declarativas.
Memória, memórias
A memória permite-nos saber quem somos
Somos quem somos porque conseguimos lembrar-nos daquilo em que pensamos. Cada pensamento que temos, cada palavra que dizemos, cada acção que levamos a cabo, na verdade, o sentido de nós mesmos e o sentido de ligação com outros, deve-se à nossa memória, à capacidade de o nosso cérebro registar e armazenar as nossas experiências. A memória é a cola que aglutina a nossa vida mental, a base que sustenta a nossa história pessoal e que possibilita o crescimento e a mudança ao longo da vida. Quando se perde a memória perde-se a capacidade de recriar o nosso passado e, em consequência, perde-se a nossa ligação connosco próprios e com os outros.
Adaptado de L. Squire e E. Kandel, Memória. Da mente às moléculas, 2002
A identidade pessoal
Já sabemos que à medida que vamos adquirindo informação o nosso cérebro se modifica. Uma vez que todos somos educados em ambientes de certo modo diferentes e temos experiências também diferentes, a arquitectura do cérebro de cada um de nós é alterada de forma única. Mesmo os gémeos idênticos, que partilham os mesmos genes, não têm cérebros iguais, pois também eles têm experiências de vida algo diferentes. É evidente que cada um de nós tem um conjunto de estruturas cerebrais e um padrão comum de ligações entre os neurónios baseados no esquema da nossa espécie. Este esquema básico do cérebro humano é igual para todos os indivíduos. Mas os pormenores do esquema variam de pessoa para pessoa. Por isso, cada um de nós é único, como única é a experiência de vida registada na memória.
A maior parte daquilo que sabemos sobre o mundo não existe na nossa mente à nascença, sendo adquirido através da experiência e guardado na memória. Somos quem somos, em grande parte, devido ao que aprendemos e lembramos. Quando recordamos, utilizamos uma representação de nós próprios para nós próprios e para aqueles que nos rodeiam.
Somos a forma como nos representamos nas nossas memórias, a forma como nos definimos como pessoas e como membros de grupos através das nossas memórias, a forma como ordenamos e estruturamos as ideias nas nossas memórias e a forma como transmitimos essas memórias a outros. Somos aquilo de que nos lembramos. A perda da memória conduz à perda do sentimento de si, à perda da nossa história de vida e à perda de vínculos com outros seres humanos.
Assim, a memória permite ordenar e dar sentido às recordações significativas de uma vida. A memória organiza o processo contínuo de construção da nossa identidade, através do qual nos tornámos únicos, do ponto de vista biológico e cultural. O nosso processo de construção não tem fim. É sempre um processo de reconstrução.
Quando somos crianças, esperamos que os pais e os avós nos falem de como éramos em bebés, nos contem histórias acerca de nós, nos digam quem somos. As histórias contadas às crianças contribuem para lhes dizer quem são elas e quem são os outros, o que é o mundo, de onde vem e para onde poderá ir. A criança, quando pede ao avô para lhe contar uma história, procura não só a dimensão fantástica que o conto encerra, como também a sua própria identidade.
Fotografar as crianças é fazer-se historiador da sua infância e preparar-lhes um legado de imagens e de memórias do que foram. O álbum de retratos de uma família exprime uma recordação social. As imagens do passado, dispostas por ordem cronológica, evocam os acontecimentos importantes. São também factores de relação porque vão buscar ao passado a confirmação da sua unidade presente. É por isso que não há nada que estabeleça mais a confiança do que um álbum de família. Todas as aventuras singulares da recordação individual se esbatem e o passado comum emerge. A memória é um mosaico em que se alternam imagens e interpretações da realidade, factos e opiniões, significados e valores, sentido do passado e antecipação do futuro. Nesta perspectiva, a memória dos mais velhos serve de ponte entre o passado e o futuro, assegura a continuidade histórica e, não menos importante, leva-nos a reflectir acerca do significado individual e colectivo das recordações.
A memória social
A capacidade de evocação e de reconstrução de episódios do passado é importante não apenas para cada um de nós como para a colectividade. Histórias e memórias individuais e colectivas estão intimamente relacionadas.
Por isso, a memória não é apenas um registo da experiência pessoal. Os seres humanos têm capacidade para comunicar aos outros o que aprenderam. Ao fazê-lo, criam culturas que podem ser transmitidas de geração em geração. A memória é estruturada pela linguagem, pela observação, por ideias assumidas colectivamente e por experiências partilhadas com os outros. Tudo isto constrói a memória social.
A memória social guarda acontecimentos e experiências passadas, reais ou imaginárias. Com efeito, a experiência passada, recordada, e as imagens partilhadas do passado histórico são recordações importantes para a constituição dos grupos sociais no presente.
A memória não se divide em dois compartimentos um pessoal e outro social. Algumas das nossas recordações parecem na verdade ser mais privadas e pessoais do que outras. No entanto, esta distinção entre memória pessoal e memória social é relativa. As nossas recordações estão misturadas e têm ao mesmo tempo um aspecto social e outro pessoal.
A nossa memória estrutura-se em identidades de grupo.
Recordamos a nossa infância como membros da família, o nosso bairro como membros da comunidade local, a nossa vida profissional em função da organização em que estamos inseridos, e assim por diante. Estas recordações são essencialmente memórias de grupo e a memória de uma pessoa só existe na medida em que essa pessoa é um produto único de determinada relação de grupos.
As recordações que partilhamos com outros são aquelas que são relevantes no contexto de um certo grupo social, quer seja estruturado e duradouro (família, por exemplo) ou informal e temporário (um grupo de amigos que frequenta a mesma escola). Os grupos sociais constroem as suas próprias imagens do mundo criando uma versão própria do passado. Na verdade, as nossas recordações pessoais e até a forma como as recordamos são na sua origem, sociais. A memória é um processo complexo que inclui tudo, desde uma sensação mental altamente privada e espontânea, até uma solene cerimónia pública.
A memória colectiva é o que fica da vivência dos grupos, ou o que estes fazem do passado. Nas sociedades sem escrita há especialistas da memória, «homens -memória», narradores e contadores de histórias. Também antigamente se veneravam os velhos porque eles eram guardiães da memória, com prestígio e úteis à comunidade. A memória traduz-se num «comportamento narrativo» com uma função social, porque é uma comunicação ao outro na ausência desse acontecimento. (Sugestão de leitura: “Cão velho entre flores” de Baptista-Bastos)
A memória, paradoxalmente, tem um carácter transitório. Podemos imaginá-Ia como um lugar onde se guardam objectos de valor, adquiridos durante uma vida de árduo trabalho. Mas tratam-se de objectos que não sobrevivem à morte da pessoa e que não podem ser deixados em herança. Para nos defendermos deste carácter transitório inerente à mortalidade da memória, desenvolvemos memórias artificiais. A prótese mais antiga é a escrita, na Antiguidade, sobre tábuas de argila ou de cera e sobre papiro, na Idade Média sobre pergaminho e pele e, mais tarde, sobre papel. Sobre estas superfícies podiam traçar-se desenhos de todo o tipo, caracteres, planos, retratos, mapas. O aparecimento da fotografia, em 1839, proporcionou uma memória artificial que se aperfeiçoou rapidamente e que oferecia a possibilidade de registar imagens em movimento. A conservação do som" um sonho durante séculos, tornou-se realidade graças ao fonógrafo de Edison patenteado em 1877. Hoje em dia, dispomos de numerosas memórias externas para gravar o que registam a vista e o ouvido, cassetes, vídeos, CD, memórias de computador, hologramas. Agora, a imagem e o som podem deslocar-se no tempo, são repetíveis, reproduzíveis, numa escala que parecia impensável há 50 anos.
A amnésia não é só uma perturbação individual. A falta ou perda de memória colectiva dos povos e das nações, voluntária ou involuntária, pode produzir perturbações graves na identidade colectiva. As recordações podem ser manipuladas, consciente ou inconscientemente, pelos interesses, desejos ou censura. Na história da humanidade, a memória colectiva várias vezes foi posta em causa em lutas pelo poder. Apoderar-se da memória e do esquecimento é uma das grandes preocupações dos grupos ou dos indivíduos que dominaram e dominam as sociedades. Os esquecimentos e os silêncios da história são reveladores desses mecanismos de manipulação da memória colectiva. Por isso a memória colectiva é também um instrumento e um objectivo de poder. Em determinados momentos, a memória social foi alterada, falsificando-se arquivos, textos de História e até material fotográfico.
Há um slogan que diz «Quem controla o passado, controla o futuro; quem controla o presente, controla o futuro». (Sugestão de leitura: 1984, G. Orwell)
As recordações familiares, as histórias de um determinado lugar, de uma família, de conhecimentos não oficiais, não institucionalizados, representam a consciência colectiva não só de uma pessoa, através da sua experiência pessoal como de grupos inteiros, de famílias, de comunidades. Esta memória pode contrapor-se a um conhecimento privatizado e monopolizado por grupos que desejam defender interesses próprios. A memória procura salvar o passado apenas para dar sentido ao presente e construir o futuro. Por isso, a memória colectiva de servir para libertar e não para escravizar os homens.
Um número de telefone pode apagar-se facilmente da nossa mente, mas uma recordação da infância pode manter-se para sempre. Assim se manifestam dois grandes tipos de memória, a breve, designada por memória de curto prazo, e a duradoura, designada por memória de longo prazo.
A memória de curto prazo envolve os processos que retêm a informação temporariamente até ser esquecida ou guardada num armazém de longo prazo tornando-se potencialmente permanente.
Apresenta duas componentes, a memória imediata e a de trabalho. A memória imediata retém a informação quando é recebida, tornando-se o centro da nossa atenção em determinado momento. Ocupa o pensamento durante mais ou menos 30 segundos e tem capacidade para mais ou menos sete ou oito itens. Mas este tempo pode alargar-se se o conteúdo for repetido. Lembremo-nos de quando éramos pequenos e a nossa mãe nos pedia que fôssemos comprar alguma coisa. Íamos pela rua fora a repetir mentalmente ou a cantarolar «cinco pães, um pacote de leite, um quilo de limões e o jornal». Esta é a memória de trabalho.
A memória de trabalho é uma espécie de lista de compras que é esquecida mal acabamos de a utilizar. Da mesma forma, um número de telefone é passível de ser mantido na memória durante um pequeno período de tempo, utilizando a mesma estratégia. E para isso até o decompomos em conjunto de dois ou três elementos. Em vez de repetirmos tudo de seguida 214295637, utilizamos três grupos de algarismos 214 295 637. Agora imagine-se alguém que tinha no seu atendedor de chamadas a seguinte mensagem: «Acabou de ligar para o duzentos e vinte e oito milhões, cento e cinquenta e três mil, novecentos e quarenta e dois. Deixe a sua mensagem após o sinal ou, no caso de ter urgência, ligue para o novecentos e trinta e três milhões, setecentos e vinte e um mil, e sessenta». Seria extremamente difícil não só compreender o número como retê-lo.
A memória imediata e de trabalho operam em paralelo e são os dois componentes principais da memória de curto prazo. Mas existem outros que se manifestam posteriormente até ao estabelecimento de uma memória estável. Permitem manter a informação de minutos a uma hora ou mesmo mais, bem para além do momento em que ela está a ser activamente retida. Por exemplo, "amanhã não me posso esquecer de levar o livro para emprestar à Ana". Após a tarefa cumprida, no dia seguinte, a memória desaparece.
A memória de longo prazo envolve os processos que retêm recordações como episódios da nossa vida, rostos de pessoas conhecidas ou conceitos.
Tanto a memória de curto prazo como a de longo prazo provocam alterações na estrutura e nas ligações das células nervosas. As mesmas ligações entre neurónios podem participar nos dois tipos de armazenamento. Existe um mecanismo semelhante a um "transformador molecular" que converte a memória de curto prazo em memória de longo prazo.
Na memória de longo prazo podemos identificar dois subsistemas diferentes, a memória declarativa e a memória não declarativa. Elas dependem de sistemas cerebrais diferentes.
A memória não declarativa, também chamada implícita ou "sem registo», é uma memória automática e reflexa, que guarda as Informações de "saber como fazer as coisas". As experiências são convertidas em processos que alteram a natureza do organismo e as suas competências.
Não é uma recordação, mas uma alteração de comportamento, tal como esquiar, ler um mapa ou andar de bicicleta. É inconsciente embora possa ser acompanhada de algumas recordações, «espera lá, como é que costumo fazer isto?». Podemos aprender a fazer qualquer coisa e a seguir lembrarmo-nos de alguns elementos da mesma como, por exemplo, imaginarmo-nos a executá-Ia. No entanto, a capacidade de desempenhar a competência parece ser independente de recordações conscientes.
A memória não declarativa envolve processos de aprendizagem simples e reflexos como hábitos e condicionamentos. Por exemplo, quando aprendemos a andar de bicicleta é provável prestarmos muita atenção às manobras da roda da frente, à posição do guiador e ao acto de pedalar, primeiro com o pé esquerdo e depois com o direito. Mas quando adquirimos prática, o acto de andar de bicicleta é guardado como memória não declarativa, conduzimos e pedalamos automaticamente. Não é necessário evocar conscientemente que é preciso pressionar os pedais com o pé direito e depois com o esquerdo. Estas memórias mantêm-se intactas durante anos ou décadas.
A memória não declarativa permite-nos conservar procedimentos para actuarmos no mundo. À medida que vamos crescendo, aprendemos a dizer «por favor» e «obrigado», a lavar os dentes antes de irmos para a cama e a executar uma série de outros comportamentos que resultam da prática. Adquirimos muitos desses hábitos nos primeiros anos de vida sem qualquer esforço óbvio e quase sem repararmos que a aprendizagem está a decorrer. Por exemplo, quando aprendemos a ler, passamos com hesitação de palavra para palavra mas, depois de alguma prática, conseguimos ler rapidamente, movimentando os olhos para um ponto diferente quatro vezes por segundo, compreendendo mais de trezentas palavras por minuto.
A memória declarativa, também chamada explícita ou «com registo», é uma memória consciente do passado, um conjunto de Informações sobre pessoas, lugares, situações, acontecimentos ou factos, que guarda informações do «saber que». É a ela que habitualmente nos referimos quando usamos o termo «memória». É uma memória consciente do nome da nossa avó, do primeiro rei de Portugal, dos planetas do sistema solar, da conversa desta manhã.
Lembremo-nos do nome de um dos nossos amigos. Lembremo-nos do rosto dessa pessoa, do som da sua voz e da maneira de falar. Depois, lembremo-nos de um acontecimento particular em que tenha participado, uma conversa importante, uma viagem ou uma festa especial. Estamos a recriar o episódio, na nossa imaginação, deslocando-nos para o contexto, espacial e temporal, em que aconteceu. Parece surpreendente a facilidade com que evocamos a cena e o que se passou. Curiosamente, ao realizarmos um exercício deste tipo não precisamos de treino nem de instruções. Recordar de forma vivida o passado é algo que todos fazemos diariamente, sem grande esforço. A memória declarativa é a memória de todos os conhecimentos que podem ser «declarados» sob a forma de proposições verbais ou de imagens mentais. Ela é imperfeita, passível de inexactidões e de distorções, mas também pode ser fiel, especialmente quando guarda conhecimentos gerais sobre o mundo. Podemos confundir o nome de uma pessoa ou uma data de aniversário, mas não confundimos um elefante com uma baleia.
Muitas actividades requerem os três tipos de memória. Vejamos o jogo do ténis. Conhecer as regras ou quantos sets são precisos para ganhar uma partida envolve a memória semântica. Lembrar o lado que foi o último a servir, requer a memória episódica. Saber lançar a bola ou fazer um serviço envolve a memória não declarativa.
Processos básicos de memória (Momentos essenciais)
• Recepção e codificação da informação
• Armazenamento da informação
• Recuperação da informação
• Esquecimento da informação
O matemático John Griffith estimou que, num tempo médio de vida, uma pessoa armazena o equivalente a quinhentas vezes mais informação do que aquela que se pode encontrar em todos os volumes da Enciclopédia Britânica. John von Newmann, um dos pais dos computadores, calculou que, em média, as recordações memorizadas durante toda a vida humana deveriam atingir 2,8 x 1020 unidades elementares de informação. Correspondentes a vinte e oito milhares de milhão de bits e cerca de trezentos milhões de gigabites. Haverá espaço no nosso cérebro para este incrível volume de recordações? Em termos teóricos, o nosso cérebro não está mal equipado, cem mil milhões de neurónios, cada um dos quais com centenas ou milhares de possíveis contactos nervosos com outros neurónios, constitui uma rede nervosa de notável potência. A capacidade da memória humana depende de operações muito complexas.
A primeira operação de tratamento da informação é a recepção e codificação. À medida que chega, a informação sensorial é codificada de forma a poder ser comunicada ao cérebro.
Podem ser utilizados vários códigos. Por exemplo, pensemos na frase "Hoje está sol". Se codificarmos o som das palavras, tal como foram ditas, estamos a usar um código acústico e a informação é representada na memória como uma sequência de sons. Se codificarmos a imagem das letras, tal como estão organizadas em signos, estamos a usar um código visual e a informação é representada na memória como uma imagem. Finalmente, se codificarmos o facto "estar sol", estamos a usar um código semântico, e a informação é representada na nossa memória pelo seu significado. O tipo de código usado pode influenciar o que é lembrado.
Quando a codificação envolve bastante trabalho, ou seja, quando a informação é processada a um nível profundo, lembramo-nos dela mais facilmente.
Quando estamos a estudar um assunto, quanto mais gostarmos dele, quanto mais necessidade, desejo ou curiosidade tivermos, quanto mais nos implicarmos nessa tarefa, melhor será a sua aprendizagem. Mesmo quando a memória de qualquer facto pareceu não exigir esforço, o processo não é assim automático. Determinadas situações ou factos são recordados porque nos interessam realmente, mesmo sem termos consciência disso. Lembramo-nos porque desencadeamos espontaneamente operações de codificação profundas e elaboradas. Se não estivermos a fazer um esforço deliberado, são os nossos interesses e preferências que direccionam a atenção e influenciam a quantidade e a qualidade da codificação.
O segundo processo é o armazenamento. Trata-se da manutenção da informação ao longo do tempo, muitas vezes durante muito tempo.
Recordar umas férias da infância depende da capacidade de armazenamento da nossa memória. De que forma é que a informação codificada se mantém na memória? Não existe um sítio específico no cérebro onde se arrumam as recordações. No entanto, a informação não está espalhada por todo o lado. Ainda não é possível localizar os pontos onde a representação de um determinado objecto está armazenada. Mas as novas técnicas de recolha de imagens cerebrais têm mostrado que várias regiões cerebrais estão envolvidas no registo de um único acontecimento, e que cada região contribui de forma diferente para o todo. As alterações no cérebro, resultado da codificação e do registo da experiência, produzem traços mnésicos também chamados engramas.
A informação nova vai modificar um conjunto complexo de processos bioquímicos e cada informação, engrama, é representada por uma configuração particular da actividade nervosa. Num primeiro momento, o engrama é dinâmico e produzem-se mudanças nas ligações neuronais. Depois, torna-se estrutural, permanente, e capaz de reproduzir a actividade nervosa necessária à actualização da informação. Por isso, a memória não se estabelece num momento. Pelo contrário, leva um tempo considerável a desenvolver a sua forma permanente. O processo de fixação requer várias etapas e até estar completo, a memória mantém-se vulnerável a perturbações. Grande parte deste processo completa-se durante as primeiras horas de aprendizagem. Mas a estabilização estende-se muito para além deste ponto e envolve alterações contínuas na organização da memória de longo prazo.
O terceiro processo é a recuperação. Ocorre quando localizamos a informação na memória e a trazemos à consciência.
Recuperar informações armazenadas, como um endereço ou um número de telefone, é normalmente tão rápido e fácil que parece automático. Só quando tentamos recordar outros tipos de informação, tal como a resposta a uma pergunta que conhecemos mas que não conseguimos evocar, tomamos consciência do processo de busca. O processo de recuperação inclui a evocação e o reconhecimento. Quando não somos capazes de nos lembrar do nome de alguém, mas sabemos que conhecemos aquela cara, está em jogo este processo. Analisamos o estímulo, a cara, e procuramos na memória o nome que lhe está associado. Primeiro temos que saber se conhecemos a cara ou não, reconhecimento, e depois procuramos o tal nome, evocação. Quando estamos a responder a itens de escolha múltipla, estamos perante informação que identificamos e comparamos com a que temos guardada. É uma tarefa de reconhecimento.
A recuperação é ajudada por pistas, as alternativas. Quando estamos a responder a itens de resposta aberta, temos que procurar a informação necessária, a partir de estímulos gerais. É uma tarefa de evocação. Temos de recuperar a informação sem muita ajuda. O reconhecimento tende a ser mais fácil do que a evocação.
E como a nossa memória não é um gravador de som nem de imagem, os erros podem introduzir-se em qualquer momento, durante a codificação, o armazenamento ou a recuperação. Não sabemos ainda se o cérebro tem limites para armazenar informação. Mas sabemos que algumas situações, como a fadiga ou o aborrecimento, podem dificultar todo este processo. A última operação que falta neste esquema é o esquecimento e dele nos ocuparemos a seguir.
Memória e esquecimento
Esquecimento
Florbela Espanca
Esse de quem eu era e era meu,
Que foi um sonho e foi realidade,
Que me vestiu a alma de saudade,
Para sempre de mim desapareceu.
Tudo em redor então escureceu,
E foi longínqua toda a claridade!
Ceguei... tacteio sombras... que ansiedade!
Apalpo cinzas porque tudo ardeu!
Descem em mim poentes de Novembro...
A sombra dos meus olhos, a escurecer...
Veste de roxo e negro os crisântemos...
E desse que era eu meu já me não lembro...
Ah! a doce agonia de esquecer
A lembrar doidamente o que esquecemos...!
Texto extraído do livro "Sonetos", Bertrand Brasil - Rio de Janeiro, 2002, pág. 181.
O esquecimento é uma condição da memória
Os mais velhos têm frequentemente a sensação de que a sua memória está a abarrotar de recordações e que às vezes é difícil lembrarem-se daquilo que é útil e deixar de lado aquilo que, pelo contrário, parece "inútil". Mas independentemente da idade, a maior parte das pessoas considera que a sua memória não funciona tal como gostariam.
O esquecimento é normalmente sentido como uma espécie de "patologia" da memória. Porém, todas as pessoas, dia após dia, sabem o seu nome, fazem o jantar, lêem, entram no seu carro e conduzem no meio do trânsito travando, acelerando, accionando as mudanças, sem acusarem qualquer problema de memória.
O esquecimento é a incapacidade, provisória ou definitiva, de aceder conscientemente a uma informação adquirida ou a uma experiência vivida no passado mais imediato ou mais longínquo.
No dia seguinte a vermos um filme conseguimos contar o argumento e a acção de forma detalhada. No entanto, um ano mais tarde, não nos lembramos senão de um esboço do filme e talvez de fragmentos de algumas cenas.
À primeira vista, o esquecimento parece ser uma desvantagem. Não seria melhor recordar tudo o que lemos, nunca nos esquecermos de onde deixámos as chaves ou os óculos, guardarmos todas as situações que consideramos importantes? Esta questão não tem ainda uma resposta clara, mas parece que, sem esquecimento, a nossa capacidade de adaptação estaria seriamente ameaçada. O esquecimento é consequência do funcionamento da memória e, longe de ser uma limitação, é uma necessidade. Os sistemas cognitivos artificiais não esquecem nada, o que significa que não são capazes de modificar significativamente a informação em função da sua experiência do mundo. Podemos compreender este facto se analisarmos o que se passa com pessoas que não conseguem esquecer.
Uma pergunta que parece importante é «Esquecemos realmente a informação, ela desaparece do nosso cérebro, ou perdemos a capacidade de nos lembrar dela?»
O esquecimento repressivo (motivação inconsciente)
As amnésias psicopatológicas foram identificadas no fim do século XIX, tendo sido Freud um dos investigadores que se interessaram por este assunto. Elas manifestam--se como um esquecimento defensivo. A pessoa evita a recordação consciente de um acontecimento doloroso do passado, exercendo, inconscientemente, uma repressão sobre memórias penosas. Freud considerava que situações, por exemplo da infância,
que nos tenham perturbado e produzido angústia podem ser «recalcadas», guardadas de forma a dificilmente termos acesso a elas. O esquecimento destas situações seria psicologicamente motivado. Existe um mecanismo de defesa, o recalcamento, que nos protege de recordar factos que podem ser emocionalmente muito perturbadores. Estas memórias seriam guardadas no inconsciente por serem demasiado ameaçadoras se lembradas.
O esquecimento provocado
Este tipo de esquecimento pode ser consequência da ingestão de medicação, de drogas ou de álcool. Uma das personagens de Shakespeare, Lady Macbeth, que precisa de agir em segredo, decide recorrer às bem conhecidas propriedades do álcool, e afirma: «De tal forma hei-de embrutecer os camareiros no vinho, que neles, a memória guardiã do cérebro, será fumo, e a sede da razão, um simples alambique». O álcool, como é sabido, não reduz apenas o tempo de reacção, o sentido crítico, a ansiedade, mas age também sobre a memória. E Shakespeare que, ao que parece, se embriagava frequentemente, observa que o vinho pode alterar a memória por um breve período de tempo. Uma ingestão continuada de álcool em grandes quantidades tem consequências bem conhecidas de perda de concentração, problemas de equilíbrio e deficiente sentido de coordenação. Começa por destruir células do fígado e de partes do cérebro e pode conduzir a uma forma de amnésia grave e irreversível, conhecida como Síndrome de Korsakoff, devida à falta de tiamina, uma vitamina do complexo B, que no alcoólico não é suficientemente absorvida.
Depressão
Alzheimer
Intoxicações
AVC
O efeito de drogas que criam dependência é complexo e, em geral, prejudicial para a memória. Existem fármacos que penetram nas células do cérebro para tratar várias doenças como a epilepsia, a doença de Parkinson ou estados depressivos. Tomados nas doses recomendadas, não afectam a memória de modo grave. A excepção são os chamados «tranquilizantes», que podem provocar esquecimento ou mesmo amnésia quando tomados sem vigilância médica ou em doses excessivas. Toda a medicação eficaz tem inevitavelmente efeitos colaterais. As vantagens têm de ser confrontadas com os riscos e isso só o médico pode avaliar.
O esquecimento provocado também pode ser consequência de doenças e lesões cerebrais. Traumatismos, doenças do foro neurológico, acidentes vasculares cerebrais, tumores ou intervenções cirúrgicas, podem produzir lesões directas no suporte material da memória, quer dizer, no cérebro. Por exemplo, a doença de Alzheimer é uma degradação mental progressiva, que ocorre normalmente em pessoas de idade avançada. Os primeiros sintomas são distúrbios da memória que se tornam progressivamente mais graves até à incapacidade de se reconhecer a si próprio. Nestes doentes, a memória autobiográfica parece ser a mais afectada. Os estados de stress e de depressão, ou os choques emocionais fortes também podem causar amnésias.
O esquecimento regressivo
Com a idade, muitas pessoas podem manifestar dificuldades de memória quer ao nível de aprendizagens novas, que na evocação de nomes de pessoas conhecidas ou de acontecimentos recentes. Estas perturbações são muito diferentes das referidas anteriormente, mesmo se resultarem da degenerescência progressiva dos tecidos celulares cerebrais devida à idade. No entanto, com o aumento da esperança de vida, os progressos da medicina, a vontade das pessoas mais velhas de continuarem a trabalhar e a assumir responsabilidades sociais, os efeitos negativos da senescência são diminuídos. As investigações mostram que a capacidade da memória imediata muda relativamente pouco com a idade, mas as tarefas de atenção partilhada ou a memória de trabalho são mais afectadas. É importante salientar que isto depende da ocupação da pessoa e das capacidades cognitivas que continua ou não a exercer.
O esquecimento vulgar (interferência de novas aprendizagens)
• Inibição proactiva – Deterioração dos conteúdos mnésicos provocada pela interferência de recordações passadas.
• Inibição rectroactiva – Deterioração dos conteúdos mnésicos provocada pela interferência de novas informações.
Pode acontecer que a memória esteja lá e nós não a consigamos evocar por falta de pistas. Mas também pode acontecer que os traços mnésicos não passem para a memória de longo prazo pela capacidade limitada desta memória ou porque não foram transferidos. O carácter sucessivo de actividades mais ou menos similares efectuadas pela pessoa pode ser responsável pelo esquecimento. Mas, hoje em dia, aquilo que a investigação demonstra como sendo mais provável é que, como as experiências novas implicam sempre a reorganização das representações da memória, ou seja, dos circuitos da informação nas redes de neurónios, os nossos registos da experiência vão-se alterando, enfraquecendo e modificando, produzindo-se neste processo o esquecimento. As memórias não declarativas tendem a ser mais estáveis do que as declarativas.
Memória, memórias
A memória permite-nos saber quem somos
Somos quem somos porque conseguimos lembrar-nos daquilo em que pensamos. Cada pensamento que temos, cada palavra que dizemos, cada acção que levamos a cabo, na verdade, o sentido de nós mesmos e o sentido de ligação com outros, deve-se à nossa memória, à capacidade de o nosso cérebro registar e armazenar as nossas experiências. A memória é a cola que aglutina a nossa vida mental, a base que sustenta a nossa história pessoal e que possibilita o crescimento e a mudança ao longo da vida. Quando se perde a memória perde-se a capacidade de recriar o nosso passado e, em consequência, perde-se a nossa ligação connosco próprios e com os outros.
Adaptado de L. Squire e E. Kandel, Memória. Da mente às moléculas, 2002
A identidade pessoal
Já sabemos que à medida que vamos adquirindo informação o nosso cérebro se modifica. Uma vez que todos somos educados em ambientes de certo modo diferentes e temos experiências também diferentes, a arquitectura do cérebro de cada um de nós é alterada de forma única. Mesmo os gémeos idênticos, que partilham os mesmos genes, não têm cérebros iguais, pois também eles têm experiências de vida algo diferentes. É evidente que cada um de nós tem um conjunto de estruturas cerebrais e um padrão comum de ligações entre os neurónios baseados no esquema da nossa espécie. Este esquema básico do cérebro humano é igual para todos os indivíduos. Mas os pormenores do esquema variam de pessoa para pessoa. Por isso, cada um de nós é único, como única é a experiência de vida registada na memória.
A maior parte daquilo que sabemos sobre o mundo não existe na nossa mente à nascença, sendo adquirido através da experiência e guardado na memória. Somos quem somos, em grande parte, devido ao que aprendemos e lembramos. Quando recordamos, utilizamos uma representação de nós próprios para nós próprios e para aqueles que nos rodeiam.
Somos a forma como nos representamos nas nossas memórias, a forma como nos definimos como pessoas e como membros de grupos através das nossas memórias, a forma como ordenamos e estruturamos as ideias nas nossas memórias e a forma como transmitimos essas memórias a outros. Somos aquilo de que nos lembramos. A perda da memória conduz à perda do sentimento de si, à perda da nossa história de vida e à perda de vínculos com outros seres humanos.
Assim, a memória permite ordenar e dar sentido às recordações significativas de uma vida. A memória organiza o processo contínuo de construção da nossa identidade, através do qual nos tornámos únicos, do ponto de vista biológico e cultural. O nosso processo de construção não tem fim. É sempre um processo de reconstrução.
Quando somos crianças, esperamos que os pais e os avós nos falem de como éramos em bebés, nos contem histórias acerca de nós, nos digam quem somos. As histórias contadas às crianças contribuem para lhes dizer quem são elas e quem são os outros, o que é o mundo, de onde vem e para onde poderá ir. A criança, quando pede ao avô para lhe contar uma história, procura não só a dimensão fantástica que o conto encerra, como também a sua própria identidade.
Fotografar as crianças é fazer-se historiador da sua infância e preparar-lhes um legado de imagens e de memórias do que foram. O álbum de retratos de uma família exprime uma recordação social. As imagens do passado, dispostas por ordem cronológica, evocam os acontecimentos importantes. São também factores de relação porque vão buscar ao passado a confirmação da sua unidade presente. É por isso que não há nada que estabeleça mais a confiança do que um álbum de família. Todas as aventuras singulares da recordação individual se esbatem e o passado comum emerge. A memória é um mosaico em que se alternam imagens e interpretações da realidade, factos e opiniões, significados e valores, sentido do passado e antecipação do futuro. Nesta perspectiva, a memória dos mais velhos serve de ponte entre o passado e o futuro, assegura a continuidade histórica e, não menos importante, leva-nos a reflectir acerca do significado individual e colectivo das recordações.
A memória social
A capacidade de evocação e de reconstrução de episódios do passado é importante não apenas para cada um de nós como para a colectividade. Histórias e memórias individuais e colectivas estão intimamente relacionadas.
Por isso, a memória não é apenas um registo da experiência pessoal. Os seres humanos têm capacidade para comunicar aos outros o que aprenderam. Ao fazê-lo, criam culturas que podem ser transmitidas de geração em geração. A memória é estruturada pela linguagem, pela observação, por ideias assumidas colectivamente e por experiências partilhadas com os outros. Tudo isto constrói a memória social.
A memória social guarda acontecimentos e experiências passadas, reais ou imaginárias. Com efeito, a experiência passada, recordada, e as imagens partilhadas do passado histórico são recordações importantes para a constituição dos grupos sociais no presente.
A memória não se divide em dois compartimentos um pessoal e outro social. Algumas das nossas recordações parecem na verdade ser mais privadas e pessoais do que outras. No entanto, esta distinção entre memória pessoal e memória social é relativa. As nossas recordações estão misturadas e têm ao mesmo tempo um aspecto social e outro pessoal.
A nossa memória estrutura-se em identidades de grupo.
Recordamos a nossa infância como membros da família, o nosso bairro como membros da comunidade local, a nossa vida profissional em função da organização em que estamos inseridos, e assim por diante. Estas recordações são essencialmente memórias de grupo e a memória de uma pessoa só existe na medida em que essa pessoa é um produto único de determinada relação de grupos.
As recordações que partilhamos com outros são aquelas que são relevantes no contexto de um certo grupo social, quer seja estruturado e duradouro (família, por exemplo) ou informal e temporário (um grupo de amigos que frequenta a mesma escola). Os grupos sociais constroem as suas próprias imagens do mundo criando uma versão própria do passado. Na verdade, as nossas recordações pessoais e até a forma como as recordamos são na sua origem, sociais. A memória é um processo complexo que inclui tudo, desde uma sensação mental altamente privada e espontânea, até uma solene cerimónia pública.
A memória colectiva é o que fica da vivência dos grupos, ou o que estes fazem do passado. Nas sociedades sem escrita há especialistas da memória, «homens -memória», narradores e contadores de histórias. Também antigamente se veneravam os velhos porque eles eram guardiães da memória, com prestígio e úteis à comunidade. A memória traduz-se num «comportamento narrativo» com uma função social, porque é uma comunicação ao outro na ausência desse acontecimento. (Sugestão de leitura: “Cão velho entre flores” de Baptista-Bastos)
A memória, paradoxalmente, tem um carácter transitório. Podemos imaginá-Ia como um lugar onde se guardam objectos de valor, adquiridos durante uma vida de árduo trabalho. Mas tratam-se de objectos que não sobrevivem à morte da pessoa e que não podem ser deixados em herança. Para nos defendermos deste carácter transitório inerente à mortalidade da memória, desenvolvemos memórias artificiais. A prótese mais antiga é a escrita, na Antiguidade, sobre tábuas de argila ou de cera e sobre papiro, na Idade Média sobre pergaminho e pele e, mais tarde, sobre papel. Sobre estas superfícies podiam traçar-se desenhos de todo o tipo, caracteres, planos, retratos, mapas. O aparecimento da fotografia, em 1839, proporcionou uma memória artificial que se aperfeiçoou rapidamente e que oferecia a possibilidade de registar imagens em movimento. A conservação do som" um sonho durante séculos, tornou-se realidade graças ao fonógrafo de Edison patenteado em 1877. Hoje em dia, dispomos de numerosas memórias externas para gravar o que registam a vista e o ouvido, cassetes, vídeos, CD, memórias de computador, hologramas. Agora, a imagem e o som podem deslocar-se no tempo, são repetíveis, reproduzíveis, numa escala que parecia impensável há 50 anos.
A amnésia não é só uma perturbação individual. A falta ou perda de memória colectiva dos povos e das nações, voluntária ou involuntária, pode produzir perturbações graves na identidade colectiva. As recordações podem ser manipuladas, consciente ou inconscientemente, pelos interesses, desejos ou censura. Na história da humanidade, a memória colectiva várias vezes foi posta em causa em lutas pelo poder. Apoderar-se da memória e do esquecimento é uma das grandes preocupações dos grupos ou dos indivíduos que dominaram e dominam as sociedades. Os esquecimentos e os silêncios da história são reveladores desses mecanismos de manipulação da memória colectiva. Por isso a memória colectiva é também um instrumento e um objectivo de poder. Em determinados momentos, a memória social foi alterada, falsificando-se arquivos, textos de História e até material fotográfico.
Há um slogan que diz «Quem controla o passado, controla o futuro; quem controla o presente, controla o futuro». (Sugestão de leitura: 1984, G. Orwell)
As recordações familiares, as histórias de um determinado lugar, de uma família, de conhecimentos não oficiais, não institucionalizados, representam a consciência colectiva não só de uma pessoa, através da sua experiência pessoal como de grupos inteiros, de famílias, de comunidades. Esta memória pode contrapor-se a um conhecimento privatizado e monopolizado por grupos que desejam defender interesses próprios. A memória procura salvar o passado apenas para dar sentido ao presente e construir o futuro. Por isso, a memória colectiva de servir para libertar e não para escravizar os homens.
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